A força do imponderável
18-08-2014

Esse tem sido um ano particularmente difícil para as usinas e para as tradings. As usinas sofrem com a baixa demanda de açúcar no mercado internacional, com o pesado serviço da volumosa dívida (R$ 100 por tonelada de cana, aproximadamente) e com o congelamento do preço da gasolina que distorce o preço do etanol. As tradings, por outro lado, não têm ganho dinheiro com o negócio açúcar. Por exemplo, o colapso dos prêmios negociados no mercado de exportação transforma-se em prejuízo diretamente na veia para elas. Imagine os contratos firmados já há algum tempo que contemplam descontos agora tímidos de 5-10 pontos vis-à-vis aqueles negociados no mercado à vista, que chegaram a 75 pontos. Mesmo que se tratasse de operação back-to-back ainda assim o comprador final fica com um gosto de sangue na boca, sentindo-se lesado e comprometendo a velocidade da reposição de estoques. Com esse cenário, menos tradings se habilitam a manter a máquina rodando e a demanda mingua ainda mais. Sabíamos todos da dificuldade que o ano nos impingia só não se esperávamos essa magnitude.

Nova Iorque fechou a semana com pressão sobre o vencimento outubro/2014 que encerrou esta sexta-feira negociado a 15.92 centavos de dólar por libra-peso com queda de 22 pontos (4.85 dólares por tonelada) acumulada na semana. Os demais meses que se estendem até julho/2017 fecharam basicamente inalterados ou com pequena variação negativa de 1-2 dólares por tonelada. A situação econômica na Tailândia, cujo PIB no trimestre caiu 8.2%, potencializa a pressão que a disponibilidade de açúcar naquele país provoca no mercado internacional. O spread outubro/março embutindo mais de 30% de custo e carrego anualizado.

Durante a semana, o outubro/20104 negociou 15.82 centavos de dólar por libra-peso o preço mais baixo desde 14 de fevereiro. O dólar então era de 2.3838. Neste ano, a menor cotação em NY equivalente em reais por tonelada foi de R$ 816.87 enquanto o fechamento de sexta-feira foi de R$ 826.79. Estamos muito próximos do chão: uma queda de 20 pontos nos coloca no ponto mais baixo do ano.

Repito aqui o que falamos há algum tempo nesse comentário semanal. Existe alguma semelhança entre esse estado de coisas vivido pelo açúcar com a mesma atmosfera de maio de 2010. Naquela ocasião era impossível encontrar no mercado alguém altista. O retorno de açúcar para exportação estava negativo em mais de 10%, ou seja, não pagava o custo de produção posto usina. Estava abaixo do valor do hidratado e anidro. NY chegou a bater 13 centavos de dólar por libra-peso logo no início de maio/2010. Perdera em relação aos 20 pregões anteriores 479 pontos (mais de 105 dólares por tonelada), recuperando toda a perda nos 36 pregões seguintes até alçar um incrível voo acima dos 36 centavos de dólar por libra-peso. Se vamos repetir, não se sabe. Mas enquanto isso, vamos comer muita areia ainda.

Com o triste e prematuro desaparecimento do candidato à presidência, Eduardo Campos, morto nesta semana em acidente aéreo em Santos, aumenta a possibilidade de segundo turno para as eleições. O mercado apreçou essa possibilidade e as ações da Petrobras negociaram com 8% de alta na sexta-feira. As eleições ocorrem em outubro quando o março/2015 será o primeiro mês de negociação na bolsa de NY. O alinhamento provável do preço dos combustíveis com o petróleo no mercado internacional abre uma perspectiva melhor de remuneração para o etanol para a próxima safra e diminui naturalmente a disponibilidade de açúcar brasileiro para a exportação.

Um grande produtor de cana da região de Ribeirão Preto comentou numa roda com seus pares que sua perda na produção este ano estava acima de 16%, justo ele que cuidava do canavial com todo o apuro. Outros ficam surpresos com o número relativamente alto que a Unica estima para a safra este ano. Vamos aguardar.

O fundos não-indexados estavam vendidos cerca de 54.500 lotes na semana passada e aproveitam o recrudescimento do mercado físico de açúcar para adicionarem mais vendas à sua posição. Agora estão vendidos quase 67.000 lotes.

O usineiro Jairo Menesis Balbo é um dos poucos a se manifestar de maneira contundente contra a política predatória patrocinada por Dilma: "Que mercado é esse em que a presidente usa a caneta onde tem interesse para fazer voto?". Não deveria ser assim em qualquer país sério, mas no país do PT e sua turma dá-se muito pouco valor a quem produz. Sabe-se que Dilma não gosta do setor. Desde quando um presidente da República tem que gostar ou desgostar desse ou daquele setor? Ela que vá resolver seus problemas existenciais no divã do analista. Como presidente, tem a obrigação de trabalhar pelo crescimento econômico do país. O que ela tem feito para o setor é encomendar o caixão, pois é esse o final do enredo da ópera bufa que ela e Mantega protagonizam ao sufocar o setor via congelamento de preço da gasolina.