Ao abraçar o ESG, a cana-de-açúcar reforça ser possível respeitar o meio ambiente, as pessoas e ainda ter lucro
09-11-2021

Cana-de-açúcar será primordial para que o Brasil cumpra as metas propostas durante a COP-26, em função de sua ampla contribuição na redução da emissão de gases de efeito estufa
Cana-de-açúcar será primordial para que o Brasil cumpra as metas propostas durante a COP-26, em função de sua ampla contribuição na redução da emissão de gases de efeito estufa

Leonardo Ruiz

O relatório divulgado em agosto deste ano pelo Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC) da Organização das Nações Unidas (ONU) prevê que o aquecimento global previsto para ocorrer no futuro, irá acontecer já nas próximas décadas. É que o aquecimento da superfície terrestre continuará aumentando entre 1,5°C a 2°C, caso não ocorra uma rápida e profunda redução nas emissões de dióxido de carbono (CO2) e outros gases de efeito estufa.

O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, afirma que o relatório é um “código vermelho para a humanidade”, com uma evidência irrefutável: as emissões de gases a partir da queima de combustíveis fósseis e do desmatamento estão sufocando o planeta e colocando bilhões de pessoas em risco.

Diante dessas previsões, a COP-26 (26ª Conferência das Nações Unidas para a Mudança do Clima) surgiu como o momento ideal para que líderes mundiais se unissem em torno do tema e discutissem ações imediatas para descarbonização das matrizes energéticas elétricas e de transporte, já que sem isso não será possível limitar o aquecimento da temperatura global. Neste ano, o encontro foi realizado em Glasgow, na Escócia, entre 31 de outubro e 12 de novembro.

A comitiva brasileira – liderada pelo ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite – anunciou no segundo dia de conferência que o Brasil pretende reduzir pela metade a emissão de gases de efeito estufa até 2030. “Apresentamos hoje uma nova meta climática, mais ambiciosa, passando de 43% para 50% até 2030 e de neutralidade de carbono até 2050”, afirmou Leite.

A CANA PODE FAZER ACONTECER

Na visão da Advogada Especialista em Direito Ambiental, Samanta Pineda, a cana-de-açúcar será primordial para que o Brasil cumpra as metas propostas durante a COP-26, em função de sua ampla contribuição na redução da emissão de gases de efeito estufa. “Um dos principais produtos da cana, o etanol, é um combustível verde e renovável. Já os subprodutos decorrentes do processo de produção, como o bagaço e a palha, são excelentes alternativas para geração de energia elétrica limpa. Sem falar da vinhaça, utilizada para fertirrigação dos canaviais, manejo sustentável do solo e geração de biogás. E o potencial fotossintético da cana ultrapassa o da grande maioria das plantas na flora brasileira, uma vez que sua biomassa absorve CO2 através da fotossíntese e o armazena em sua composição na forma de carbono.”


Resíduos da colheita mecanizada de cana crua, o bagaço e a palha são excelentes alternativas para geração de energia elétrica limpa (Foto: Divulgação Unica)

No entanto, sempre que os temas ambientais surgem com mais veemência, são levantadas questões para dificultar a adoção da bioenergia. Entre as muitas versões desmotivadoras que circulam pelo mundo, está:

- Não é possível produzir bioenergia sem comprometer a produção de alimentos.

 “Isso não ocorre no Brasil, temos terra suficiente para o desenvolvimento de várias culturas agrícolas, seja para a produção de alimentos ou energias renováveis. A cana é o melhor exemplo. Os esforços em aumento de produção de cana não são direcionados à expansão de área, mas na elevação da produtividade por hectare. E por meio da rotação de cultura, são produzidos outros alimentos, como amendoim, milho e soja, nas áreas de renovação de canavial”, salienta Marcelo Morandi, chefe Geral da Embrapa Meio Ambiente.

A CANA NÃO É SÓ AMIGA DO MEIO AMBIENTE, MAS DO SOCIAL E DA ECONOMIA

Outro mito destruído pela cana é: Não é possível preservar o meio ambiente e ainda obter lucro.

Quem afirma isso é quem não conhece o setor sucroenergético. Há tempos que a cana é sinônimo de lavoura amiga do meio-ambiente. E cada vez mais o setor segue o caminho da sustentabilidade, prática que agrega as esferas ambiental, social e a governança. Fatores que integram a sigla ESG (Environmental, Social and Governance na sigla em inglês), tendência no mundo corporativo contemporâneo.

É o que acontece com a BP Bunge Bioenergia. No último mês de agosto a empresa, que conta com nove unidades produtoras divididas em cinco estados, apresentou seus indicadores ambientais e sociais, seguindo a metodologia GRI (Global Reporting Initiative) em seu primeiro Relatório de Sustentabilidade, e divulgou seus compromissos ESG para os 10 primeiros anos de operação, com conclusão em 2030. A iniciativa “Nossos Compromissos 2030”, alinhada à estratégia de negócios da BP Bunge Bioenergia e aos ODS - Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, organiza metas relacionadas a temas prioritários em quatro pilares: Planeta, Pessoas, Princípios de Governança e Prosperidade.

 
"Nossos Compromissos 2030" expressa um mapa estratégico da evolução do negócio da BP Bunge Bioenergia para patamares cada vez mais sustentáveis, em favor das futuras gerações (Fonte: BP Bunge Bioenergia)

Luís Andrade, gerente de relações institucionais da BP Bunge Bioenergia, explica que são 15 compromissos estabelecidos para os dez primeiros anos de operação, sendo eles relacionados ao uso da água, mudanças climáticas, eficiência energética, biodiversidade, capital humano, desenvolvimento econômico e governança.

Entre as metas específicas, destacam-se: reduzir em 10% as emissões de gases de efeito estufa na produção de etanol; reduzir em 10% a água de uso industrial captada; plantar 2,3 milhões de mudas de espécies nativas; e atingir taxa zero de acidentes com afastamento. “O desenvolvimento sustentável é pauta das empresas do setor canavieiro há alguns anos. Juntos, conseguiremos liderar esse processo mundial de transição para a economia de baixo carbono”, afirma Andrade.

SUSTENTABILIDADE ESTRATÉGICA GARANTE A PERPETUIDADE DAS EMPRESAS

Na visão das consultoras Juliana Farinelli e Cristiane de Simone, a BP-Bunge Bioenergia aderiu a sustentabilidade estratégica, uma forma de gestão que emoldura os novos modelos de negócios e se tornou uma garantia de perpetuidade das empresas, independente do segmento em que atuam.

Esse conceito surgiu a partir de mudanças na ideologia dos consumidores, que além de qualidade e preço, se preocupam se a fornecedora daquele produto atua com responsabilidade socioambiental em suas operações, processo produtivo e para com a sociedade, como as comunidades locais e populações menos favorecidas. “Esses valores também são transferidos para as empresas, que terão o mesmo nível de exigência para com seus fornecedores de matéria-prima, criando assim uma cadeia retroativa e completa em termos de sustentabilidade’’, salienta Cristiane.


A engenheira agrônoma Juliana e a administradora de empresas Cristiane vivem na região de Jaboticabal, no interior paulista, onde elas vivenciam o show de sustentabilidade produzido pelo campo (Foto: Arquivo pessoal)

As profissionais explicam que hoje a sustentabilidade tem base na área de governança, passando a ser um item fundamental na estratégia das companhias. “A governança entra no novo modelo de negócios, uma vez que é a partir dela que se faz a gestão estratégica da sustentabilidade numa visão sistêmica dos impactos e aspectos relevantes de serem trabalhados. Sua incorporação dentro das organizações repercute tanto em benefícios indiretos (maior eficiência no uso de recursos e processos; redução de risco de passivos trabalhistas e ambientais; maior qualificação e permanência da mão de obra) como diretos (venda de crédito, agregação no valor da marca e produto, abertura de mercado e fidelização de clientes).”

A engenheira agrônoma Juliana e a administradora de empresas Cristiane vivem na região de Jaboticabal, no interior paulista, onde elas vivenciam o show de sustentabilidade produzido pelo campo. Mas perceberam que é possível as empresas e produtores potencializarem o resultado da sustentabilidade. Por isso, criaram a AgroVerde Consultoria em Sustentabilidade Estratégica, focada em fornecer suporte não só para o desenvolvimento da sustentabilidade estratégica, mas para que seus clientes desfrutem de forma mais ampla os seus benefícios.

CANAVIAIS OFERECEM MAIS UM PRODUTO: CRÉDITOS DE SUSTENTABILIDADE

Entre os benefícios diretos, Juliana cita a comercialização de créditos de carbono, emitidos por companhias comprometidas com a sustentabilidade e adquiridos por pessoas físicas e jurídicas que queiram compensar suas próprias emissões de gases de efeito estufa.

Juliana explica que esse mercado surgiu da necessidade mundial de um maior cuidado para com os recursos naturais da Terra a fim de melhorar a qualidade de vida da população e mitigar os impactos advindos das mudanças climáticas. “Os créditos de carbono, também chamados de créditos de sustentabilidade, funcionam como uma remuneração e incentivo para aquelas organizações que estão auxiliando no processo de descarbonização.”

Na indústria canavieira, existem atualmente duas formas para a comercialização de créditos de sustentabilidade. A Bonsucro, player global que atesta a adoção de práticas sustentáveis em toda a cadeia produtiva da cana-de-açúcar, disponibiliza uma plataforma de negociação que oferece uma maneira direta para as empresas apoiarem unidades industriais e agricultores sustentáveis em todo o mundo. A Bonsucro permeia cadeias de suprimentos globais complexas e conecta produtores e compradores diretamente, fornece também um incentivo financeiro aos produtores e usinas para seus investimentos em sustentabilidade.


Na indústria canavieira, existem atualmente duas formas para a comercialização de créditos de sustentabilidade (Foto: Arquivo CanaOnline)

Atualmente, um crédito representa uma tonelada de cana de açúcar, açúcar bruto, melaço ou um metro cúbico de etanol certificados pela Bonsucro. Os produtores definem o preço de seus produtos. A plataforma pode combinar os preços automaticamente com os requisitos do comprador. Os créditos são negociados separadamente dos produtos físicos que representam – que podem então ser vendidos em transações convencionais de commodities. Em dezembro de 2020, foi realizada a primeira comercialização através da plataforma. Quarenta canavicultores brasileiros venderam coletivamente 162.300 toneladas em créditos de cana sustentável para a Barry Callebaut, uma produtora mundial de chocolate.

Outra possibilidade é a venda de Créditos de Descarbonização (CBIOs), emitidos através do RenovaBio, política nacional de biocombustíveis que estabelece metas nacionais anuais de descarbonização para o setor de combustíveis, de forma a incentivar o aumento da produção e da participação de biocombustíveis na matriz energética de transportes do país. Cada CBIO corresponde a uma tonelada de CO2 evitado e deve ser adquirido por distribuidores de combustíveis fósseis como forma de atingir suas metas de descarbonização.

“Nos últimos anos, o agronegócio tem sofrido com as constantes mudanças climáticas. Em paralelo, o consumidor final está cada vez mais atento, procurando por produtos que sejam produzidos com responsabilidade socioambiental. Esse é um caminho sem volta. O mercado de créditos no âmbito da sustentabilidade surge no melhor momento possível, impactando os modelos tradicionais de negócio e fazendo com que as empresas passem a considerar os recursos naturais como ativos dentro de suas estratégias”, analisa Cristiane.

CERTIFICAÇÃO CONTRIBUI PARA COMPROVAR A SUSTENTABILIDADE DA CANA

No dia 21 de junho de 2011, a unidade Maracaí, pertencente ao Grupo Raízen e instalada no município paulista de mesmo nome, se tornou a primeira usina de cana-de-açúcar certificada pela Bonsucro. O selo assegura que a empresa cumpre a legislação vigente, respeita os direitos humanos e trabalhistas, garante sustentabilidade na produção e preserva a biodiversidade e os serviços do ecossistema.

Poucos mais de 10 anos se passaram, e a Bonsucro segue como o principal padrão métrico global para a cultura da cana-de-açúcar. No mundo, mais de 1,3 milhão de canaviais estão certificados pela plataforma, sendo 1,1 milhão localizados no Brasil. Globalmente, a Bonsucro já certificou 137 usinas. Dessas, 73 estão instaladas em território nacional.

Como benefícios gerais decorrentes do processo de certificação, destacam-se a melhoria no desempenho e performance das operações, maior maturidade e excelência na gestão social e melhor gerenciamento de risco. O selo ainda permite a abertura de mercados mais exigentes, como o da União Europeia, que apenas adquire açúcar e biocombustíveis produzidos segundo rigorosos critérios de sustentabilidade.

CERTIFICAÇÃO NÃO É EXCLUSIVIDADE DAS UNIDADES SUCROENERGÉTICAS

Mas não são apenas as usinas que podem se tornar certificadas pela Bonsucro. O selo é voltado também para produtores independentes e viveiristas. No dia 07 de junho deste ano, a Spinagro, de Batatais, SP, se tornou a primeira produtora nacional de Mudas Pré-Brotadas (MPB´s) a obter a certificação Bonsucro Smallhoders.

A Spinagro também obteve o Selo 2030 Today, que integra a Agenda 2030 e faz parte de um plano global composto pelos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, os ODS, e 169 metas, para promover vida digna para todos em nosso planeta. Os ODS servem como filtro para entendimento do nível de sustentabilidade da empresa, visando melhorar os processos, economizar recursos e obter resultados, impactando positivamente o ambiente interno e externo.

Segundo a gerente técnica e sócia-fundadora da Spinagro, Laura Vicentini, as certificações não irão aumentar o valor unitário das mudas, mas permitirão uma maior competitividade da empresa dentro de um mercado acirrado e que valoriza cada vez mais o investimento sustentável.


Em julho deste ano, a brasileira Spinagro se tornou a primeira empresa no Brasil – e também o primeiro produtor de Mudas Pré-Brotadas (MPBs) de cana-de-açúcar - a ser certificada pelo Padrão Bonsucro para Pequenos Produtores (Foto: Divulgação Sprinagro)

Na balança atual, os critérios que integram a sigla ESG estão entre os de maior peso, uma vez que as empresas que adotam essas práticas possuem maior capacidade de se adequar às novas tendências e demandas, além de se tornarem menos suscetíveis a riscos externos, como mudanças regulatórias e/ou multas e sanções caso utilizem demasiada e/ou agressivamente os recursos naturais ou ocasionem desastres ambientais.  

“Além de me colocar em uma vantagem competitiva frente às empresas que não possuem certificações, esses selos permitem também a abertura de mercados antes não explorados, como usinas que, até então, não compravam MPBs de terceiros, pois parte de sua cadeia produtiva ficaria fora das exigências internacionais, impedindo a comercialização de seus produtos para determinados players do mercado”, explica Laura.

ECONOMIA CIRCULAR TEM TUDO A VER COM A CANA

A cana gera tantos produtos, que cada vez mais fica difícil de classificá-la apenas como cana-de-açúcar, afinal, ela é de etanol, energia, plástico, biogás e tantas outras coisas. Outro aspecto muito interessante da cana é o seu poder de promover a economia circular, um modelo econômico quem tem seus moldes na redução, reutilização, recuperação e reciclagem de matérias-primas e energia buscando fazer um melhor uso dos recursos naturais.

Um belo exemplo da relação da cana com a economia circular é a fábrica de biogás da Raízen, instalada na Usina Bonfim, sua unidade produtora localizada em Guariba, no nordeste paulista. Inaugurada em 16 de outubro de 2020, a fábrica entrou para a história, afinal se trata do maior projeto de biogás do mundo e o primeiro do segmento canavieiro.

Para a produção do biogás, utiliza-se a vinhaça e a torta de filtro como matérias-primas. A fábrica de biogás da Usina Bonfim tem capacidade instalada para gerar 21MW e o potencial de produção de 138 mil MWh por ano, suficiente para iluminar uma cidade de 240 mil habitantes. Ainda, parte desse gás poderá ser utilizado para produzir biometano, que, uma vez purificado e comprimido, tem potencial para substituir o diesel nas máquinas agrícolas e caminhões. Para cada metro cúbico de diesel substituído por gás, o custo é 50% menor.


Em outubro de 2020, Raízen inaugurou sua primeira planta de biogás. Uma das maiores do mundo, a estrutura foi construída anexo à Usina Bonfim (Foto: Divulgação Raízen)

Porém, não é de hoje que a Raízen busca explorar ainda mais o potencial da cana. O Gerente de Projetos E2G e Biogás do grupo, Luciano Zamberlan, explica que a diversificação do portfólio da empresa teve início há sete anos, com a construção da primeira planta de E2G do mundo, localizada na unidade Costa Pinto, de Piracicaba/SP. Produzido a partir do bagaço proveniente da produção do açúcar e etanol comum, o E2G permite um aumento de 40% a 50% na produção de etanol sem que seja necessário plantar 1 hectare a mais de cana-de-açúcar. “Se pegássemos toda a matéria-prima disponível em nossas 35 unidades agroindustriais, seria possível produzir de 10 a 12 bilhões de litros a mais por hectare por safra.” Atualmente, a planta de E2G da Raízen produz 30 milhões de litros de etanol celulósico por ano. A expectativa é que a empresa construa três novas plantas num futuro próximo.

Zamberlan conta que a Raízen também planeja construir uma nova planta de biogás que produzirá bioeletricidade e terá capacidade para produzir gás biometano, que poderá ser utilizado em substituição ao óleo diesel em parte da frota de veículos ou injetado em redes de distribuição. O investimento irá girar na ordem de R$ 150 milhões. “Tanto o E2G como o biogás fazem parte de nossa estratégia de negócio. Focamos nossos investimentos em soluções sustentáveis, sejam elas do ponto de vista ambiental, social, econômico e/ou de governança”, ressalta.

COCAL IMPLEMENTA A SUSTENTABILIDADE ESTRATÉGICA DO NEGÓCIO

Dos canaviais paulistas sai mais um modelo da dobradinha cana e a economia circular. Em 2015, a Cocal, detentora de duas unidades agroindustriais localizadas no Estado de São Paulo, instituiu uma nova diretoria cujo objetivo principal era buscar a sustentabilidade estratégica do negócio. Um dos caminhos encontrados foi a diversificação dos produtos. Hoje, a companhia possui um dos portfólios mais variados do setor, produz açúcar, etanol, energia elétrica, biogás, biometano e CO2 foodgrade.

“Enxergamos o conceito de sustentabilidade em seu todo, não apenas a óbvia pegada ambiental.  Buscamos atender a parte social, por meio do desenvolvimento das regiões onde atuamos. E o lado da viabilidade econômica da atividade, pois à medida que ampliamos os produtos ofertados ao mercado, criamos fontes de receita dentro do Grupo”, analisa o Diretor-Comercial e Novos Produtos da Cocal, André Gustavo Alves da Silva.


Expansão do portfólio da Cocal teve como objetivo a sustentabilidade estratégica dos negócios da companhia (Foto: Divulgação Cocal)

Em 2002, a Cocal foi um dos primeiros players do segmento a investir na cogeração de energia elétrica limpa a partir da queima do bagaço da cana-de-açúcar e outros tipos de biomassa. Recentemente, a companhia manteve seu pioneirismo ao investir na construção de uma planta que utiliza alguns resíduos industriais (torta de filtro, vinhaça e palha de cana) para produção de biogás.

A fábrica está localizada na Unidade Narandiba e produz 33 milhões de m³ por ano. 47% desse volume é destinado para geração de energia elétrica (5 MW por hora). O restante é utilizado para produção de biometano e CO2 foodgrade. “Produzimos um total de 48 toneladas por dia de CO2 foodgrade, um produto que é 100% comercializado para empresas de bebidas e refrigerantes. Já os 24 mil m³ de biometano gerados por dia podem atender indústrias, comércios e residências. E tem potencial para substituir combustíveis fósseis em empresas comprometidas com a redução da emissão de CO2. Inclusive, temos em torno de oito projetos em testes dentro da companhia para utilizá-lo em nossa frota de veículos”, afirma o Diretor-Comercial e Novos Produtos da Cocal.

A aposta da Cocal no biogás é tamanha que a companhia já possui um projeto avançado para construção de uma nova planta, desta vez, na Unidade Paraguaçu Paulista. A expectativa é que as obras iniciem em março de 2022.

NÃO SE DERRUBA ÁRVORES PARA PRODUZIR ETANOL

Outro argumento levantado pelos contrários ao etanol é que para aumentar sua produção, as lavouras canavieiras irão se expandir, promovendo o desmatamento, inclusive da Amazônia. “A cana-de-açúcar está há 2700 quilômetros de distância da Amazônia. Não haverá plantio de cana na Amazônia. E para atender ao RenovaBio, e conquistar os CBIOs, uma das exigências é que o desmatamento seja zero. Se apenas uma árvore for retirada, por exemplo, em uma área de 10 mil hectares, todos os dez mil hectares não podem ser incluídos no RenovaBio.”, destaca Miguel Ivan Lacerda, Diretor do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET) e quem liderou a equipe que criou o RenovaBio.

O setor tem levado o RenovaBio a sério e as empresas que já tinham compromisso com a responsabilidade socioambiental levam vantagem. É o caso da Usina Lins, localizada no município paulista de mesmo nome, que reformulou seu plano estratégico, incorporando a sustentabilidade em suas operações, tornando-a, um dos valores da companhia. A Gerente de Qualidade e Meio Ambiente, Olívia Merlin, salienta que o compromisso com a responsabilidade ambiental está presente em todas as ações adotadas internamente, que abrangem desde o uso responsável do solo até a colheita de cana crua, utilização controlada de resíduos do processo produtivo e circuito fechado para reuso de água no processo industrial.


Cana-de-açúcar está há 2700 quilômetros de distância da Amazônia. Não haverá plantio de cana na Amazônia (Foto: Arquivo CanaOnline)

“Somos certificados pelo RenovaBio, tendo vendido até o momento aproximadamente 291 mil CBIOs. Também finalizamos um diagnóstico a fim de identificar nossos pontos fracos e fortes no âmbito da sustentabilidade e definir uma matriz de materialidade. Para os próximos anos, nossa meta é fomentar os projetos de sustentabilidade da empresa, obter a certificação Bonsucro e criar um relatório de sustentabilidade no formato GRI.”

Dentre os programas conduzidos pela Usina Lins, Olívia destaca o “Semear”, um projeto iniciado em 2010 e que, até 2020, realizou o plantio de 852 mil mudas de árvores em margens e nascentes de rios em fazendas que a empresa utiliza para plantio, incluindo áreas próprias, de fornecedores e de parceiros. Essas regiões são consideradas Áreas de Preservação Permanente (APPs) e são protegidas por lei. “Além de ser de grande importância no combate às mudanças climáticas e até mesmo à preservação da própria vida humana, esse reflorestamento auxilia nossos fornecedores e parceiros a se adequarem ao novo Código Florestal.”

A profissional explica que a usina é responsável por todo o processo de reflorestamento, incluindo o levantamento, preparo, plantio e cuidados das áreas até que elas estejam aptas a se manterem sozinhas. “Após esse período, entregamos um relatório para o produtor rural que detalha todas as ações adotadas em sua área. Posteriormente, esse documento poderá ser utilizado pelo produtor para a elaboração do PRA - Programa de Regularização Ambiental de sua propriedade. Lembrando que 100% do projeto é custeado pela usina.”

Olívia ressalta que a Usina Lins não possui viveiro próprio. Todas as mudas são adquiridas de ONGs ou entidades (terceiros), visando fomentar a economia dessas instituições e regiões.

 CANA É MODELO DE CULTURA AGRÍCOLA SUSTENTÁVEL, MAS PECA NA COMUNICAÇÃO

Na visão do Chefe Geral da Embrapa Meio Ambiente, Marcelo Morandi, o setor sucroenergético é modelo de práticas ambientalmente sustentáveis. “Somente a mudança da colheita manual para a mecanizada trouxe enorme benefícios, com destaque para a melhoria da qualidade do solo e do ar. O mesmo protocolo que propôs o fim da queima pré-colheita no Estado de São Paulo incentivou a adoção de uma série de outras boas práticas ambientais, como adequação ao Código Florestal, técnicas de conservação do solo, conservação e reuso da água, medidas de proteção à fauna e prevenção e combate a incêndios florestais.”

O protocolo citado por Morandi foi assinado voluntariamente em 2007. As signatárias são responsáveis por 91% da produção paulista de cana-de-açúcar e 43% da produção nacional de etanol. Dados da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica) indicam que, nos últimos 14 anos, o setor deixou de emitir mais de 11,8 milhões de toneladas de CO2 e mais de 71 milhões de toneladas de poluentes atmosféricos (monóxido de carbono, material particulado e hidrocarbonetos). E promove a proteção e recuperação de mais de 200 mil hectares de áreas ciliares e 8.230 nascentes.


Se em 1990 era necessária uma captação de 5 m³ de água por tonelada de cana processada, em 2021 esse volume figura abaixo de 1 m³/ton, uma redução de mais de 80% (Foto: Divulgação Tereos)

“Atualmente, a grande maioria das usinas paulistas já possui áreas voltadas exclusivamente ao meio ambiente, com projetos de grande extensão e impacto, como redução do consumo e reutilização da água nos processos industriais, o reflorestamento de Áreas de Preservação Permanente (APPs) próprias e de fornecedores e a criação de corredores ecológicos, porções de ecossistemas que promovem a ligação entre áreas fragmentadas, sendo importantes por garantir o deslocamento de animais e a dispersão de sementes entre essas áreas.”

No entanto, o Chefe Geral da Embrapa Meio Ambiente ressalta que o setor precisa comunicar melhor suas ações para a população, principalmente àquelas pessoas que residem fora dos grandes centros de produção de cana. “A população desconhece as externalidades positivas do etanol, as boas práticas de produção do setor, seu compromisso com o ESG. Muitos ainda enxergam a cana com a mesma percepção de décadas atrás. Por conta disso, a comunicação precisa ser fortalecida para mudar esse cenário.”

Mais uma vez, a cana foi comparada à pata, que bota um ovo bem maior que o da galinha, mas não leva a fama, por não cantar, anunciar que botou. A cana precisa usar sua energia e fazer como a galinha, botando a boca no mundo para anunciar que anda abraçada com as práticas da ESG e o que isso significa.

 Fonte: CanaOnline

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