Ao infinito e além
08-08-2016

Arnaldo Luiz Corrêa

O mercado de açúcar em NY fechou a semana com uma estrondosa alta de 130 pontos no vencimento outubro/2016, cotado no pregão de sexta-feira a 20.35 centavos de dólar por libra-peso. Os fundamentos tiveram pouca influência uma vez que nenhuma novidade apareceu nesses dias, mas não faltam explicações aqui e ali para ver se alguma delas se encaixa num movimento que é eminentemente técnico. Os fundos não-indexados continuam com uma posição muito grande, pouco mais de 300.000 contratos. Como essa posição é a de terça-feira passada e o mercado subiu fortemente de lá para cá, não seria surpresa se víssemos a posição deles aumentar além desse volume.

Ninguém mais duvida que o déficit mundial de açúcar deva persistir nas próximas duas safras apontando - em tese - para uma consolidação dos preços da commodity no mercado internacional. Nessa linha, deveria causar surpresa o fato de os preços negociados em NY apresentarem uma curva aceleradamente descendente a partir do vencimento maio/2017 até o último mês de negociação em aberto, que é o maio/2019, embutindo um desconto de quase 14% entre os dois períodos citados. A curva de preços não se encaixa na perspectiva consensual, por parte do mercado, de que haverá menor produção de açúcar lá adiante. O que há de errado, então, nessa fotografia?

Essencialmente, para a grande maioria das usinas brasileiras, que pensa em reais por tonelada, os valores negociados em NY têm de ser obrigatoriamente convertidos pela taxa do dólar à vista acrescida da diferença entre as taxas de juros - brasileira e americana - consideradas no período analisado. Portanto, a curva do real é aceleradamente ascendente, contrapondo-se à curva dos preços do açúcar em NY. As usinas que pensam em dólares, em razão do seu endividamento na moeda americana, esperam a melhora do quadro político econômico no Brasil, que deve valorizar o real e, consequentemente, refletir melhores preços do açúcar no mercado internacional, fazendo com que o seu endividamento seja pago com menor quantidade de produto.

Se assumirmos que a moeda brasileira irá se valorizar à medida que a confiança do mercado retorne, os preços do açúcar em NY deverão sofrer reação similar e simultânea. Se hoje temos um gráfico invertido do açúcar, mostrando preços em centavos de dólar por libra-peso mais altos nos vencimentos mais curtos e mais baixos nos vencimentos mais longos, ao transportarmos esses valores para reais, a curva tem outra forma, mostrando valores, em reais por tonelada, menores nos vencimentos mais curtos e maiores nos vencimentos mais longos, apenas interrompidos nos meses cuja pressão da safra do Centro-Sul do Brasil se faz sentir. Dessa forma, qual gráfico estaria mais em consonância com o quadro fundamentalista do açúcar atual? A resposta é, evidentemente, que o gráfico em reais por tonelada reflete melhor este cenário.

Quando fazemos o caminho inverso, ou seja, convertemos o gráfico em reais pela taxa de câmbio estimada pelas consultorias (tomamos os dados da MB Associados como referência e ajustamos aos meses de vencimento), estimamos que o março/2017 deve ultrapassar os 22 centavos de dólar por libra-peso, a safra 2017/2018 entre 21-22.50 centavos de dólar por libra-peso e a 2018/2019 aproximadamente um centavo melhor. Acredito que os fundos tem 24 centavos de dólar por libra-peso como objetivo. Só não podemos esquecer o seguinte: o mercado de commodities não é uma ciência exata.

Nos últimos três meses o açúcar já se valorizou 25% (o segundo melhor desempenho das commodities agrícolas, perdendo apenas para o suco de laranja que ganhou 30% no período), contra uma queda de 10% no petróleo. Se você fosse o gestor de um fundo, você não pensaria em trocar de posição nesse momento?

* Artigo originalmente publicado no portal Archer Consulting. Comentário semanal de 01/08/16 à 05/08/16.

Arnaldo Luiz Corrêa - Diretor da Archer Consulting