Contra o pânico: sangue frio, foco e disciplina
14-11-2016

Por Arnaldo Luiz Correa

A incerteza sobre que tipo de administração a Casa Branca terá a partir de janeiro do próximo ano com a surpreendente eleição do candidato republicano Donald Trump causou uma onda de desvalorizações de ativos ao redor do mundo e o real sofreu a maior queda num intervalo de três dias (de quarta a sexta) desde a crise de 2008, em outubro quando a desvalorização atingiu mais de 12.5%. A moeda norte-americana chegou a negociar a R$ 3.4987 na última sexta-feira contra um fechamento de R$ 3.1669 há três dias, uma desvalorização de 9.48%.
Como alguns bancos apostavam fortemente na valorização do real até o final do ano por conta do ajuste fiscal brasileiro e da possibilidade de maior fluxo de investimentos externos, não seria surpresa que a volatilidade da taxa de câmbio esteja vinculada à cobertura dessas posições vendidas a descoberto. O mesmo pânico ocorrido em 2008, no meio da crise financeira mundial, desfez-se um par de semanas depois daquele pico.
Mercados exageram tanto na alta quanto na baixa. Lembro sempre o caso de um gestor de fundos baseado na Ásia que declarou do alto da sua soberba, logo após o contrato de açúcar em NY negociar a robustos 36 centavos de dólar por libra-peso em fevereiro de 2011, que estaríamos caminhando céleres aos 60 centavos de dólar por libra-peso, validados pelo analista Jim Rogers que previa 75 centavos de dólar por libra-peso. Se alguém acreditou nisso naquela época, pagou caro para ver.
Para o setor sucroalcooleiro é uma excelente oportunidade de fixar preços em reais ao longo da curva de futuros em NY combinada com o NDF (contrato a termo de dólar com liquidação financeira). Essas instabilidades são passageiras. Já vivemos outras situações de volatilidade antes e vamos ver mais ainda no futuro. Sangue frio, disciplina e foco são necessários para que se tire o melhor dessa crise. Na sexta-feira, em determinado momento o valor em reais por tonelada do primeiro mês de vencimento do açúcar em NY chegou a R$ 1,730 para encerrar o pregão ao preço combinado de R$ 1,696. Não adianta querer acertar o olho da mosca voando. Mas, nota-se que há pressão de venda, ou pelo menos, aumentam as consultas junto aos provedores desse tipo de operação quando o valor obtido se aproxima dessa faixa de preço.
Bem, o açúcar encerrou a semana com o contrato futuro de março/2017 negociando a 21.70 centavos de dólar por libra-peso, uma pequena variação negativa de 3 pontos em relação à sexta anterior. No entanto, os meses com vencimento a partir do maio de 2018 em diante fecharam com quedas entre 50-60 pontos, ou 10 e 13 dólares por tonelada.
Com a enorme distância entre o que o Brasil precisa produzir para atender à demanda potencial de combustível e o aumento de consumo de açúcar no mundo (dependendo do açúcar brasileiro em cerca de 50%), projetando os próximos cinco anos, parece difícil imaginar que seremos capazes de acrescentar pelo menos 125 milhões de toneladas de cana para 2021/2022 somente para atender ao etanol combustível. Vai acabar o hidratado? Vamos importar etanol de milho? Ou importaremos mais gasolina para atender o consumo interno? Há sete anos, o etanol hidratado era responsável por 31.2% do consumo do ciclo Otto, hoje responde por 20.9%, um encolhimento anual de 5.6%. Onde o setor quer estar daqui a 10 anos?
Pelas nossas projeções, devemos encerrar o ano com um consumo total em gasolina equivalente de 53.2 bilhões de litros, uma retração de 0.75% em relação ao ano de 2015. Caiu pouco se compararmos com a queda do PIB e da renda das pessoas.
A quinta estimativa de fixação de preços das usinas no mercado futuro de açúcar em NY para a safra 2017/2018 mostra, segundo o modelo desenvolvido pela Archer Consulting, que até o final de outubro de 2016 pouco mais de 8 milhões de toneladas já haviam sido fixadas (30.6% da exportação estimada). O preço médio apurado foi de 17.21 centavos de dólar por libra-peso. Em safras anteriores, o percentual máximo de fixação acumulada até o mês de outubro foi de 25% em 2014/2015. Preços remuneradores incentivam às usinas a anteciparem suas fixações. O percentual só não é maior devido a uma enorme parcela das usinas que estão impossibilitadas de fixar preços por restrições de crédito. O valor médio ajustado de fixação, considerando as NDFs (contratos a termo de dólar com liquidação financeira) é estimado em R$ 1.544,96 por tonelada, ou 67.25 centavos de reais por libra-peso, sem prêmio de polarização.