Controle de preço da gasolina e aumento de custos levaram etanol à crise
13-10-2014

A julgar pela participação relativa do etanol hidratado na matriz de combustíveis do Brasil, o biocombustível perdeu competitividade em relação à gasolina nos últimos anos. Em 2009, o hidratado representava 37% do volume total de combustível consumido no país. Em 2014, essa proporção deve ficar próxima de 15%.

Há quem diga que esse resultado se deve à queda ou estagnação da produtividade do segmento, o que aumentou os custos de produção e comprimiu as margens do setor. Nesse contexto, cabe esclarecer em primeiro lugar que a produtividade não é determinada apenas pela boa ou má gestão da produção, ela depende de investimentos em capital físico e humano.

Além disso, nas atividades agroindustriais é obrigatório considerar o clima. Essa é uma indústria a céu aberto, influenciada por intempéries climáticas, pragas, doenças e outros fenômenos inerentes a qualquer processo biológico - e que, portanto, fogem ao controle do produtor. Certamente a falta de condições para investimento pode acentuar as perdas decorrentes destes fenômenos, mas a queda de produtividade não se explica por um fator isolado.

De qualquer forma, a argumentação sobre a suposta falta de produtividade do etanol no Brasil merece uma análise mais detalhada e cuidadosa. As estatísticas disponíveis revelam um aumento considerável nos custos nominais de produção do hidratado no país, superior a 70% entre 2007 (ano anterior à crise financeira mundial) e 2012.

É verdade que nesse período o rendimento por hectare caiu bastante, atingindo 5,6 mil litros na safra 2011/2012 na região Centro-Sul contra uma média histórica de 6,9 mil litros e indicadores que superam 7,2 mil litros por hectare nas áreas mais produtivas. Mas, ainda que o setor tivesse operado com uma produtividade próxima a esse potencial de 7,2 mil litros, o aumento nominal nos custos alcançaria 64%.

O problema central é que essa alta dos custos ocorreu justamente no momento em que o preço da gasolina passou a ser utilizado para o controle da inflação no país. Entre 2007 e 2012, o valor do derivado permaneceu constante na refinaria e o preço pago pelo consumidor brasileiro aumentou apenas 9% em termos nominais. No mesmo período, o custo de aquisição da gasolina importada cresceu mais de 35%.

O ganho de produtividade necessário para que o custo de produção do etanol aumentasse em iguais 9% - e, assim, continuasse competitivo frente à gasolina - seria da ordem de 8,5% ao ano. Nem mesmo a lavoura de grãos, uma das atividades agrícolas mais competitivas do Brasil, apresentou tal crescimento - na última década, o aumento de sua produtividade foi de 4% ao ano.

Portanto, erram grosseiramente aqueles que afirmam que a atual crise enfrentada pelo setor sucroenergético brasileiro é fruto da falta de investimento em tecnologia e da má gestão da produção. O cerne desta crise advém dos maiores custos em um período de mudança abrupta das regras do jogo quanto às decisões relativas a matriz energética nacional.

Na base do aumento de custos está o atendimento à agenda ambiental e às maiores exigências trabalhistas, além das despesas financeiras decorrentes dos investimentos realizados na produção e dos prejuízos obtidos após o congelamento dos preços da gasolina.

A mudança na política de preços, por sua vez, se deu por meio da desoneração da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE) cobrada sobre a gasolina, sem contrapartida ao etanol. Entre 2007 e 2012, essa desoneração de R$ 0,28 por litro garantiu preços estáveis ao consumidor quando houve elevação no valor do derivado cobrado na refinaria, ao mesmo tempo em que transferiu R$ 14 bilhões dos cofres públicos à Petrobrás.

Essa lógica perversa eliminou a diferenciação tributária entre o etanol e a gasolina, incorporou incertezas desnecessárias nesse mercado e alterou completamente o cenário promissor vislumbrado pelos empresários. Nesse cenário, é inconcebível creditar a crise pela qual passa a indústria nacional de cana-de-açúcar a uma suposta falta de produtividade e incapacidade gerencial.