Falta racionalidade econômica à indústria da cana
17-07-2014

Nos dias atuais, a indústria brasileira da cana, do açúcar e do etanol vive o pior período dos seus 500 anos de existência. Desde o ano safra de 2009/2010, mais de quatro dezenas de empresas deixaram de produzir, sendo mais de 20 delas no estado mais pujante da nação. Trinta e três usinas encontram-se, atualmente, com a sua situação em exame no Judiciário e 12 unidades não vão moer na safra já em curso, de 2014/2015.

Com a obstinada decisão do governo federal de não majorar os preços da gasolina e absoluta falta de uma política governamental de combustíveis no país, o etanol está sendo vendido com prejuízos às distribuidoras.

A defasagem do preço do combustível da cana em relação à gasolina automotiva é de 18%, gerando uma perda de R$ 5,4 bilhões, tão somente para o etanol anidro.

O consumo, em 2014, do etanol anidro (misturado 25% à gasolina) está estimado em mais de 23 bilhões e terá de subir, conforme os especialistas, para 32 bilhões a 40 bilhões de litros nos próximos oito anos, até 2022, desde que 20% a 30% do etanol seja usado na frota de veículos do país.

O endividamento do setor sucroalcooleiro já supera R$ 60 bilhões. As usinas de açúcar e as destilarias estão vendendo o etanol hidratado ao preço de R$ 1,20/litro, enquanto o valor da fabricação já supera R$ 1,25. Nos postos de abastecimento paulistas, o etanol está sendo oferecido, em média, a R$ 1,90/litro; a gasolina, a R$ 2,90/litro.

Conforme o setor bancário, o endividamento da atividade econômica já evoluiu perto de 20 vezes, nos últimos 10 anos, e a produção pouco mais que dobrou. No primeiro trimestre deste ano, o Brasil importou perto de 30% das suas necessidades de gasolina, o que poderia ser substituído pelo etanol. Para isso, não haveria a necessidade do dispêndio de preciosas divisas, tecnologia externa, máquinas importadas ou recursos humanos de outros países. Em 2009, não importava gasolina.

É sempre bom recordarmos, quando se tenta colocar em dúvida, com discussões bizantinas, a eficiência do etanol combustível, alguns fatos marcantes. Entre nós, o álcool já era utilizado como combustível desde o início da década de 1920.

Os foguetes alemães, as famosas bombas voadoras da Segunda Guerra Mundial, usavam, também, o álcool produzido a partir das batatas ou de resíduos alimentares, assim como os primeiros foguetes, lançados pelos americanos no Cabo Kennedy. Os japoneses adaptaram no último conflito mundial os seus tanques de guerra para rodarem a álcool.

É imprescindível e urgente a adoção de um amplo programa de refinanciamento das enormes dívidas da indústria da cana, a fim de resolver a gravidade da questão. Há dois anos, o segmento sucroenergético investiu mais de R$ 4 bilhões na renovação das lavouras canavieiras, com o escopo de recuperar a produtividade e aumentar a oferta do vegetal.

O atual governo, definitivamente, se desinteressou pela agroenergia, por razões ignoradas. Com a intenção de reduzir a inflação, a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) foi suprimida da gasolina, perdendo o etanol a sua competitividade com o derivado do petróleo.

Outra antiga reinvindicação do setor é o maior envolvimento da indústria automobilística com o desenvolvimento de um motor especialmente construído para a queima do etanol, mais econômico e eficiente.

Consoante as informações da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (UNICA), nos próximos 10 anos, o universo vai consumir 26 milhões de toneladas do açúcar, a cada ano, e necessitará de 60% a mais de álcool combustível.

Dessa forma, o país terá que elevar a moagem em 200 milhões de toneladas de cana anuais, o que será inexequível diante da atual conjuntura da atividade econômica. Para o professor Plínio Nastari, presidente da Consultoria Datagro, o futuro da indústria da cana, do açúcar e do álcool, nos próximos 10 anos, estará ligado, intrinsicamente, à política governamental dos derivados do petróleo, o que é uma incógnita.

Luiz Gonzaga Bertelli