Imobilismo e perplexidade
20-02-2015

O imobilismo e a perplexidade têm sido as principais características do governo diante da tragédia da Petrobrás e da crise no setor elétrico. É como se você estivesse diante de um ente querido abatido por uma grave doença e sua reação fosse de somente acender velas, rezar e torcer para que a natureza e Deus se encarreguem da cura, em vez de procurar um médico e um bom hospital.

No caso da Petrobrás, a divulgação do balanço do 3.º trimestre de 2014, não auditado, mostrou como a empresa está à deriva e agonizando. No dia seguinte à divulgação, as ações da Petrobrás caíram e as agências de risco voltaram a rebaixar sua nota, deixando a empresa a um passo de perder o grau de investimento. Chamou a atenção a baixa contábil das duas Refinarias Premium (Ceará e Maranhão), registrando perda de R$ 2,7 bilhões. E os R$ 88 bilhões divulgados como oriundos de superfaturamento, corrupção e ineficiência são estarrecedores. Dias após a divulgação desses números, a presidente Graça Foster e cinco diretores renunciaram - e percebeu-se que a saída ocorreu em razão da publicação de números que incomodaram o governo. Ou seja, havia vários motivos para a saída da diretoria, mas ela caiu por falar a verdade. A renúncia foi intempestiva e com ares de rebelião, o que deixou o governo em maus lençóis para escolher substitutos. Mas o desgaste de Graça era de tal ordem que sua renúncia provocou uma disparada nas ações da Petrobrás, que subiram 15%.

E, quando todos esperavam que o governo escolhesse um substituto que significasse mudança e autonomia, ele de forma surpreendente optou por um nome ligado ao continuísmo, ou seja, mudar para não mudar. O mercado reagiu, com a queda das ações da estatal. E não bastava escolher o nome errado, a forma como ele foi divulgado pelo governo mostrou de novo total desrespeito pelos acionistas minoritários. O nome de Bendine foi anunciado pela imprensa e com o mercado aberto. Mais uma vez, a CVM se mostrou ausente. Parece, assim, que o poço em que a Petrobrás se meteu é mais profundo que os do pré-sal, pois dele não se vê o fim.

No setor elétrico as coisas não são diferentes. Diante de um cenário de falta de energia, o ministro de Minas e Energia pede ajuda a Deus, que aparentemente se cansou de ser brasileiro diante de tanta incompetência e corrupção. Em vez de procurar uma solução democrática, convocando para uma grande discussão todos os agentes do setor, o governo resolve, de forma autoritária e unilateral, promover um tarifaço. Não basta realismo tarifário, a crise é muito profunda e é injusto transferir toda a sua pseudossolução para os consumidores. Aliás, esse tarifaço fará com que aconteça um aumento grande da inadimplência e estimulará o furto de energia, o que prejudicará muito as finanças das distribuidoras. Além disso, pagamos a energia mais cara do mundo, sem garantia de abastecimento e de qualidade. Definitivamente, não dá para entender como o governo insiste em mascarar a crise e continua levando o nível dos reservatórios a uma situação em que não haverá mais água para gerar energia.

Da mesma forma que a presidente Dilma, no início de 2013, anunciou em cadeia nacional de rádio e de TV a redução de 18% das tarifas elétricas, deveria agora repetir a cena, agora pedindo para a população economizar energia. Em vez de ficar imóvel e perplexo diante do caos, o governo, responsável, tem o dever cívico de anunciar o racionamento propondo medidas de racionalização. Com isso poderia evitar prejuízos maiores por meio de redução voluntária no consumo, como em 2001.

Soluções existem e precisam ser tomadas. O que não pode é o governo seguir escondendo da população a gravidade do problema, nos setores de petróleo e elétrico, e adotar como única medida tarifaços na energia elétrica e obrigando os brasileiros a pagarem a gasolina mais cara do mundo. O governo erra, cometeu enormes barbeiragens nos últimos quatro anos e nós, consumidores e contribuintes, vamos pagar a conta dessa incompetência. Isso nada mais é do que extorsão.

*Texto originalmente publicado nesta sexta-feira (20) no O Estado de S.Paulo.