Ingredientes na panela
20-03-2017

Por Arnaldo Luiz Corrêa

Conceitualmente, volatilidade no mercado de commodities está intimamente ligada à oferta e demanda do produto. Quanto maior a incerteza sobre a disponibilidade de uma matéria prima mais participantes estarão dispostos a pagar mais para se proteger dos efeitos negativos que essa disruptura pode trazer a eles. Igualmente, fatores exógenos podem contribuir para potencializar as oscilações de preços. No mercado de açúcar tem sido fartos os ingredientes cozidos nesse caldeirão.

Uma generosa dose de incerteza vem da Índia quando se analisam as perspectivas de produção e a eventualidade de aquele país importar açúcar. O preço do barril do petróleo abaixo de cinquenta dólares e o real se valorizando em relação à moeda norte-americana são outros componentes que afetam negativamente a paridade do etanol, diminuem a margem de contribuição e empurram as usinas a maximizar a produção de açúcar. Isso combinado com a perspectiva precedente de que o mix de produção da safra 17/18 prioriza a produção de açúcar, deprimem ainda mais os preços no mercado internacional.

Em commodities, é verdade, há momentos em que todos os fatores aparentam ser altistas e em outros, como parece ser o caso agora, em que todos os fatores parecem baixistas. A euforia e o desespero revezam-se no protagonismo sobre esse palco chamado mercado, seduzindo uma horda de abnegados seguidores que ora agem com entusiasmo infantil ora com pessimismo mórbido.

Do mesmo modo que ouvíamos, há alguns meses, teimosos gestores ignorando os altos preços negociados em reais por tonelada que garantiriam um excelente resultado para as empresas (porque acreditavam que o mercado futuro iria ainda mais longe), agora, ouvimos das mesmas bocas, “que tem muito açúcar” e há temor de maiores quedas adiante. Vá entender.

Diante da impossibilidade de adivinharmos o futuro, com exceção daqueles que ainda acreditam em gurus e que procuram médicos que receitam remédios produzidos em suas próprias farmácias, o melhor antídoto para as crises "existenciais" que nos vitimam é usar calculadora e disciplina. Por isso, é reconfortante saber, por exemplo, que várias usinas estão entre 80 e 100% hedgeadas para a safra 2017/2018. E algumas já entraram nas fixações de 2018/2019. Ou seja, fizeram a lição de casa, trataram o negócio com disciplina e dispensaram os conselheiros espirituais.

Preços nos níveis que vimos nesta sexta-feira, com a mínima de 17.50 centavos de dólar por libra-peso negociando no vencimento maio/2017, começa a mudar a abordagem dos produtores europeus. Por exemplo, será que a Europa vai expandir sua exportação como se achava quando o mercado orbitava ao redor dos 22-23 centavos de dólar por libra-peso? Preços baixos do açúcar no mercado internacional estreitam a arbitragem com o etanol e persistindo a pressão lá fora, não faria mais sentido para a usina produzir etanol cujo valor é melhor para o fluxo de caixa imediato da usina? Essas respostas valem ouro.

Em outras palavras, o potencial de queda a partir de agora começa a ser bem menor. Chegamos ao fundo do poço? Mercados de commodities costumam exagerar na alta e na baixa e seria temerário apostar que já vimos o chão, mas os fundos liquidaram bem suas posições e ganharam muito dinheiro com elas. Com base no fechamento da terça passada eles estão apenas 95,000 contratos comprados. NY pode retrair um pouco mais, buscando 16-17 centavos de dólar por libra-peso porque sazonalmente abril-maio-junho-julho tem preços médios menores do que o março, mas vemos uma eventual visita nesses níveis como uma oportunidade de fixação para os consumidores industriais ou mesmo de recompra de hedge para aqueles que tem pressão arterial de um menino de quinze anos.
Os ingredientes são fartos, como dissemos e o resultado dependerá da dose de cada um. A entrega de março foi um ponto de exaustão de um mercado altista. Se chegamos ao fundo ainda vai depender do que vai sair dessa panela.

O fechamento de NY a 18,17 centavos de dólar por libra-peso e o dólar a R$ 3,1010 representam menos de R$ 1,300 por tonelada. E lá se vão mais de R$ 450 por tonelada desde a máxima negociada em outubro do ano passado. Dá uma dor de cotovelo, não dá não? Não se desespere, coloque um CD de bolero bem triste, uma caixa de lenços de papel e tome uma dose de uísque. Vai passar.

O Brasil está no fundo do poço também? Assim esperamos. Treze milhões de desempregados, 7.2% de queda do PIB em dois anos. Herança de um governo de canalhas, corruptos e bandidos. Poucos se salvam nesse lamaçal que virou a vida política nacional. Que pesadelo. Como o refrão que ficou famoso nos anos 80, “se gritar pega ladrão, não fica um”. O Blue Label continua aguardando ser servido para comemorar o dia em que o bandido número 1 for preso.