Mais uma entrega volumosa: chegamos ao fundo?
02-05-2017

Por Arnaldo Luiz Corrêa

O mercado de açúcar em NY continua afundando como se não houvesse amanhã. Estamos assistindo a uma superabundância de notícias baixistas que se acumulam, potencializando a queda e provocando pânico e desespero naqueles que viram o mercado chegar a derreter 700 reais por tonelada em sete meses e ficaram só olhando. Como sói acontecer em situações assim, quem estava altista lá em outubro passado e só iria vender açúcar a R$ 2,000 por tonelada agora teme que o mercado quebre e seja obrigado a fixar a R$ 1,000.

O vencimento maio/2017 chegou a negociar 15.12 centavos de dólar por libra-peso durante a semana, para expirar nesta sexta-feira a 16.04 centavos de dólar por libra-peso. Em relação à semana passada, NY caiu 37 pontos (8.16 dólares por tonelada). Os meses correspondentes à safra 2017/2018 caíram em média 7.50 dólares por tonelada, enquanto que os da 2018/2019 se desvalorizaram em 7 dólares por tonelada. Baseado no fechamento de sexta, o vencimento maio expirou a R$ 1.172 por tonelada.

A entrega do maio/2017, alcançou 1.5 milhão de toneladas demonstrando mais uma vez a fraqueza do mercado físico.

A pergunta que o mercado quer saber a resposta é se os fundos vão se posicionar na venda a descoberto a partir desses níveis. Pode até ocorrer, mas o potencial de lucro abaixo de 16 centavos de dólar por libra-peso deve ser muito limitado.

E aquelas empresas que não fixaram seus açúcares de exportação para embarques contra o vencimento julho? Vão fixar a qualquer preço? É inacreditável que empresas bem estruturadas, sem problema de caixa, mas tendo apenas o dono tomando decisão baseada em sabe-se lá que premissa tão otimista, estejam com volume de fixação para 2017/2018 abaixo de 30%. Falta disciplina e humildade.

Mudando um pouco de assunto, como se sabe, desde o ano passado o Ministério das Minas e Energia (o MME) iniciou uma discussão transparente sobre como expandir a produção de biocombustíveis no país com previsibilidade e sustentabilidade ambiental, econômica e financeira, de olho no potencial crescimento do mercado e em consonância com os compromissos assumidos pelo país na COP21 (o tal Acordo de Paris, que definiu medidas para reduzir os efeitos das mudanças climáticas e que foi aprovado por quase todos os países). Não é apenas sobre o etanol a expansão, mas também sobre o biodiesel, que faz do Brasil o segundo maior produtor e consumidor mundial.

Para se ter uma ideia, o MME assume que o Brasil teria que dobrar a produção de etanol até 2030, para algo em torno de 50 bilhões de litros. Hoje, pelas estimativas da Archer, no cenário atual, não conseguiríamos chegar nem em 35 bilhões, o que nos colocaria, em 2030, na condição de importadores de etanol de milho e/ou de gasolina para atender a demanda que vai se formar adiante.

Para atingirmos esse ambicioso objetivo de 50 bilhões de litros precisamos de previsibilidade, regras claras, investimentos, segurança jurídica, transparência na formação de preços dos combustíveis e a criação de um mecanismo que propicie ao biocombustível (via preço) as vantagens que ele embute concernentes à sustentabilidade ambiental.

Ora, ora. E quem seria contra isso, não é mesmo? O setor sucroalcooleiro sofreu ao longo dos 13 anos de governo petista enormes prejuízos ao ter sido usado como principal financiador indireto da indústria automobilística. Preços artificialmente baixos da gasolina estimularam o consumo via expansão da frota, incentivos fiscais (hoje sabemos que Medidas Provisórias foram negociadas com o Executivo) e o setor tendo que vender etanol na bacia das almas. É só olhar o gráfico do endividamento total do setor comparado com o fim do imposto sobre combustíveis: São inversamente correlatos.

A Petrobras não apoia o RenovaBio. Ela acredita que a competitividade da indústria e do setor agropecuário pode ser comprometida. Como o Brasil, segundo ela, já possui alta participação de combustíveis renováveis na sua matriz deveria estar desobrigado de criar mais espaço para os biocombustíveis. A conversa é velha. Aquela mesma história, infundada, de que os biocombustíveis têm impacto na produção de alimentos e no desmatamento. Até a conceituada The Economist já caiu nessa falácia em 2006/2007 quando estampava em suas páginas que a era da comida barata estava chegando ao fim quando o petróleo negociava acima de 130 dólares por barril.

A estatal brasileira do petróleo argumenta que "até a Europa se afasta desse tipo de solução" (combustíveis renováveis), como se fosse possível comparar o que o Brasil possui de terras disponíveis agriculturáveis com o Velho Mundo. No seu Relatório Técnico, a Petrobras alerta para a concorrência entre a gasolina C e o etanol hidratado e os fatores exógenos decorrentes (cambio, impostos, etc.); sobre a alocação do mix de produção e os efeitos que os mandatos de biocombustíveis podem trazer no preço internacional do açúcar e, aponta que a taxa de crescimento da população adulta (capaz de adquirir um veículo) cai mais aceleradamente do que a taxa populacional. Ou seja, por que expandir se a frota vai cair lá adiante?

Estimativas da Archer mostram que independentemente de RenovaBio, o consumo em 2030 deve atingir 73.5 bilhões de litros de gasolina equivalente (Ciclo Otto) e um aumento de frota da ordem de 13 milhões de veículos (expansão de 17 milhões de veículos flex e redução de 4 milhões de veículos a gasolina). O RenovaBio é a chance que o setor tem de não perder um mercado que gera empregos aqui dentro e de poder se reestruturar depois de anos subsidiando os desmandos tresloucados de Lula, Dilma e sua tigrada.

A Unica divulgou esta semana seu número de safra: 585 milhões de toneladas de cana, divididas em 35.2 milhões de toneladas de açúcar e 24.7 bilhões de litros de etanol. O número é muito próximo da estimativa da Archer Consulting, divulgada no início de janeiro, de 586 milhões de toneladas de cana, sendo 35.5 milhões de toneladas de açúcar e 24.1 bilhões de litros de etanol.

A Seara Agroindustrial, umas das grandes empresas do agronegócio no Brasil sediada no Norte do Paraná, entrou na semana passada com um pedido de recuperação judicial bilionária com um passivo estimado em R$ 2 bilhões. Entre os credores estão grandes financiadores do setor sucroalcooleiro. Isso significa menos dinheiro disponível para as usinas. Entre os maiores credores estão uma cooperativa de produtores americanos (R$ 681 milhões), um banco europeu com forte presença no agronegócio (R$ 153 milhões), um fundo baseado em NY (R$ 144 milhões), um banco brasileiro de pequeno porte (R$ 113 milhões) e uma trading americana (R$ 56 milhões). A empresa estava exposta às variações de preço da soja e milho no mercado internacional.

*Artigo originalmente publicado no portal da Archer Consulting em 29/04. Comentário semanal de 24 a 28 de abril.