Máquinas vão colher 97% da safra de cana em Minas
30-06-2015

Na Usina Agropéu, em Pompéu, Região Central do estado, 12 máquinas de grande porte trabalham 24 horas por dia, colhendo a nova safra de cana-de-açúcar. Até novembro, quando o ciclo se encerra, serão 1,1 milhão de toneladas, transformadas em açúcar, álcool e energia. Onde é possível a entrada das colhedeiras, o trabalho humano foi 100% substituído. Em todo o estado, 97% da safra atual será colhida pelas máquinas fabricadas no Brasil, modelo que substitui a queima do canavial. Cada colheitadeira faz o trabalho de 85 cortadores de cana.
O novo sistema promove um trabalho mais saudável, menor agressão ao meio ambiente e até o retorno de animais que haviam abandonado o canavial. É bem mais ecológico e nem sempre acaba com as vagas de emprego, como muitos imaginam. A expectativa é que a produção em 2015 surpreenda e seja recorde em Minas, com 61 milhões de toneladas de cana moída, 3 bilhões de litros de etanol e outras 3 milhões de toneladas de açúcar, marcando também o fim da transição entre o trabalho humano e o plantio e a colheita mecanizados.
Na Agropéu, unidade de médio porte e uma das primeiras a atingir o percentual de mecanização exigido em protocolo ambiental assinado entre o setor sucroalcooleiro e o governo do estado, a colheita mecanizada passa dos 90%. “Só não usamos máquinas onde a declividade é acima de 12% e não permite a entrada do equipamento”, aponta Geraldo Otacílio Cordeiro, diretor-presidente da indústria. Para o executivo, a mudança de perfil, que trocou o facão pelas colhedeiras, trouxe benefícios para o meio ambiente e respondeu a uma demanda do setor.
A eliminação da queima da palha da cana reduziu a emissão de gases do efeito estufa. Entre 2008 e 2014, foram 6,1 milhões de toneladas de CO2 a menos na atmosfera. A palha, que agora fica sobre o solo, também contribui para reter a umidade na terra, se transformando em adubo natural. “Se não houvesse a mecanização, hoje também não teríamos mão de obra suficiente para responder à necessidade do setor”, diz Cordeiro.
QUALIFICAÇÃO
Em 10 anos, a Agropéu investiu R$ 18 milhões em equipamentos e na formação da equipe. Segundo a Associação das Indústrias Sucroenergéticas de Minas Gerais (Siamig), em todo o estado, os aportes do setor foram na ordem de US$ 3 bilhões entre 2008 e 2014. Dados do sindicato apontam para 55 mil empregos diretos no setor em 2008, e 80 mil em 2015. “Trabalhadores foram qualificados e absorvidos em outras funções”, defende Mário Campos, presidente da Siamig.
Segundo ele, a mecanização da lavoura coincidiu com momento de crescimento do setor. Apesar da crise, que culminou com o fechamento de oito usinas no estado nos últimos cinco anos, as 37 unidades de Minas vão produzir 44% mais que em 2008. A expansão da atividade produtiva permitiu que o setor crescesse no número de empregos gerados.
De acordo com Cordeiro, quando o processo de mecanização foi iniciado, há cerca de 10 anos, eram 700 funcionários. Hoje, a usina emprega 1 mil trabalhadores. “Conseguimos implementar o processo sem demitir, porque a produção cresceu de 600 mil para 1,1 milhão de toneladas”, justifica.
Para Vilson Luiz da Silva, presidente da Federação dos Trabalhadores na Agricultura em Minas Gerais (Fetaemg), a mecanização é um caminho sem volta, assim como a preocupação com os postos de trabalho perdidos é permanente. Segundo ele, nem todos foram absorvidos pelo processo de capacitação e acabaram deixando o campo, retornando para a cidade. Como ex-cortador de cana, ele lembra que o trabalho é duro e extenuante, mas se preocupa com a recolocação de quem foi substituído e não assumiu outras funções. “É importante haver políticas para fixar o trabalhador no campo, como a implementação do crédito fundiário”, defende.
Nelson Krastel, produtor de cana-de-açúcar no Triângulo Mineiro, conta que seu quadro de trabalhadores foi reduzido com a mecanização, mas que os funcionários deixaram a condição de temporários para permanentes, com melhores salários e benefícios, como plano de saúde e cesta de alimentos. Ele conta que já chegou a empregar, sazonalmente, 200 funcionários de abril a novembro, na época da colheita. Agora , tem 140 empregados fixos e conta que todos os seus operadores de máquina são ex-cortadores de cana.
“A colheita mecanizada deixa mais impurezas na cana e tem menor rendimento, mas qualificou a mão de obra. Mesmo com o menor rendimento, prefiro o modelo que temos agora”, diz o produtor.Leandro de Carvalho hoje é operador de máquinas e comemora a evolução dos últimos anos.
Mais qualidade no trabalho, e também na vida. Cortar a cana com ajuda da foice, enfrentando o sol quente, deixou de ser realidade para muitos trabalhadores rurais, que nos últimos anos participaram de cursos de qualificação para operar o maquinário agrícola. Nesse novo cenário, estão os colegas Leandro Agostinho de Carvalho e Cleiton Luiz Pereira. Os dois começaram cedo na lida na lavoura e com 18 anos já manuseavam bem os equipamentos para corte manual da cana.
O trabalho antes era por temporada. “Não posso reclamar porque era a oportunidade que a gente tinha. Mas o corte da cana é bem cansativo. Depois de um dia de trabalho não sobra destreza para quase nada”, lembra Leandro. Nos últimos oito anos, ele passou por vários estágios da atividade. Funcionário da usina Agropéu, na Região Central do estado, ele migrou do corte manual para a área de controle biológico. Depois, fez curso para motorista de transbordo (trator de suporte às colheitadeiras) e nesta safra se tornou um operador de máquinas.
“Posso dizer que o trabalho hoje é bem melhor”, diz o trabalhador, que acabou gostando do processo de capacitação e pretende seguir adiante, para – quem sabe no futuro – assumir novas responsabilidades. Comparando com o trabalho que realizava como cortador de cana, ele calcula que é possível ganhar perto de R$ 1 mil a mais por mês.
CANDIDATO
Pai de três filhas, Cleiton Luiz Pereira, de 29 anos, também se qualificou. Quando Daiana, de 11 anos, sua filha mais velha nasceu ele era cortador de cana, trabalho feito após a queima da palha. Hoje, também é operador de máquinas. “Quando o encarregado avisou que haveria treinamentos para quem quisesse aprender outras funções, eu me candidatei”, recorda.
Cleiton conta que trabalhar com as máquinas exige conhecimento e atenção, mas que no intervalo de um ano ele saltou do posto de tratorista para operador de colheitadeira. “Trabalho oito horas por dia, sendo cinco dias de serviço e uma folga.”
A empregabilidade do setor coincide com a expansão da produção. A União da Indústria de Cana-de-Açúcar (UNICA) anunciou que a estimativa para a safra 2015/2016 de cana-de-açúcar é de 590 milhões de toneladas no país, o que corresponde a um crescimento de 18,66 milhões de toneladas em relação ao total processado na safra anterior (2014/2015), que somou 571,34 milhões de toneladas. O aumento se deve a melhor produtividade agrícola impulsionada pela melhoria das condições climáticas.