Pesquisadores buscam em civilizações do passado a agricultura do futuro
26-04-2016

As pesquisas agropecuárias olham para a frente. Buscam novidades que permitam avanços na produção.

Pesquisadores da Embrapa estão de olho, porém, em tecnologias utilizadas por civilizações pré-colombianas, há milhares de anos.

Essas tecnologias, se aplicadas hoje, seriam importantes para o desenvolvimento da agricultura tropical.

Em algumas áreas da Amazônia, há a ocorrência de solos pretos, ou Terra Preta de Índio. São solos escuros e férteis numa região em que, em geral, o solo é muito pobre.

Algumas plantas exigentes em nutrientes, como mamão e leguminosas, se dão muito bem nesses solos, que contêm muitos artefatos indígenas, pedaços de cerâmicas e restos de material e de alimentos utilizados por esses povos. É um solo antrópico -modificado pelo homem.

A dúvida dos pesquisadores é se esses solos foram preparados especialmente para o desenvolvimento da agricultura ou se foram um mero manejo de resíduos que resultou nessa fertilidade.

É uma questão de difícil resposta, mas os pesquisadores querem saber como essa terra ficou tão fértil.

"Hoje temos dificuldades em fazer uma terra fértil. A pergunta é como essa civilização conseguiu uma terra tão fértil na Amazônia e que dura até hoje", afirma Wenceslau Geraldes Teixeira, pesquisador da Embrapa Solos.

Essa prática tem de 1.000 a 2.000 anos. E o que caracteriza a fertilidade do solo são os nutrientes. O problema, na avaliação de Teixeira, é como segurá-los no solo para, no momento apropriado, serem utilizados pelas plantas.

"Esse é o problema da maioria dos solos tropicais. Eles não têm a capacidade de segurar os nutrientes no solo. A única coisa que dá essa carga é a matéria orgânica. No solo tropical, a decomposição é muito alta, devido a micro-organismos, calor e água."


Biocarvão

Os resíduos utilizados por essas civilizações pré-colombianas foram carbonizados, gerando o biocarvão, que consegue reter o nutriente.

Esse biocarvão segura os nutrientes que vêm da cinza, de resíduos de alimentação e de objetos que o povo de uma aldeia trazia de fora.

Teixeira diz, ainda, que a pesquisa busca aprender também com os sambaquis. Espécies de sítios arqueológicos, são formados por conchas e contêm camadas de solos férteis com carbono e nutrientes.

Olhando para esses exemplos de terras férteis do passado -os sambaquis têm ao menos 4.000 anos-, os pesquisadores querem reproduzir esses mecanismos, carbonizando resíduos e adicionando nutrientes para compor um fertilizante organomineral de nova geração.

Podem ser utilizados resíduos carbonizados vindos de lixo doméstico, bagaço de cana e cascas de amendoim, de arroz e de coco, além de vários outros produtos.

Como esses produtos são regionalizados, cada uma das regiões teria um ponto de apoio específico para produzir esse adubo organomineral.

O que os pesquisadores querem é pegar a tecnologia de fixação de nutrientes na terra que deu certo nessas civilizações. "É uma fonte de inspiração", diz Teixeira.

A fixação de nutrientes no solo permitirá uma grande redução de gastos para os produtores. Atualmente, boa parte desses nutrientes é perdida com a chuva e, com isso, parcela importante da adubação se dispersa.


Fixação

Os pesquisadores querem, portanto, pegar essa tecnologia indígena e descobrir o que permitia a fixação de nutrientes. Esse aprendizado permitiria a utilização de elementos modernos, como adubos orgânicos ou químicos.

"Com isso, aumentaríamos a eficiência da agricultura, diminuindo custos", diz ele.

Teixeira frisa que o objetivo da pesquisa não é propagar o uso das Terras Pretas de Índio ou dos sambaquis, mas entender o mecanismo -como aquilo se formou e por que a terra ficou tão fértil. Entendido o processo, os pesquisadores usariam essa tecnologia em processos modernos.

Teixeira afirma que um dos seus pontos de interesse é a utilização do lixo urbano nesse processo.

Mas é necessário um projeto de conscientização na população, o que colocaria o lixo em condições melhores de uso. Afinal, toda a logística do sistema de coleta já existe.

Mauro Zafalon