Pesquisas com novas proteínas visam tornar mais eficientes os processos industriais que utilizam a biomassa
04-08-2016


A Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) está investindo em pesquisas com proteínas que revolucionaram o conceito clássico de decomposição da celulose das plantas. Trata-se das monoxigenases de polissacarídeos, enzimas produzidas apenas por fungos e algumas bactérias, que atuam como auxiliares das proteínas já conhecidas por promover a desconstrução da celulose. Um projeto de pesquisa liderado pela Embrapa Agroenergia (Brasília/DF) está estudando não apenas as monoxigenases, mas também outro grupo de proteínas chamadas de expansinas. A expectativa é que a caracterização de novas proteínas desses dois tipos permita, em futuro próximo, aplicá-las para tornar mais eficientes os processos industriais que utilizam biomassa vegetal para obter açúcares e, a partir deles, produzir combustíveis, polímeros e produtos químicos de origem renovável.

Até pouco tempo, acreditava-se que a decomposição da celulose por microrganismos na natureza ficava a cargo de diversas enzimas do tipo celulase, que “quebram” as cadeias de celulose até chegar a simples moléculas de açúcar, por meio de reações químicas que geram água e, por isso, são chamadas de hidrólise. Na última década, contudo, descobriu-se que as celulases não realizam sozinhas aquele trabalho de “quebra”. Muitos fungos e algumas bactérias produzem as monoxigenases de polissacarídeos, enzimas que também rompem as cadeias de celulose, porém por meio de reações químicas diferentes, de oxidação. Além delas, também têm papel importante as expansinas, que são tipicamente encontradas em plantas, mas também ocorrem em microrganismos e até mesmo em alguns animais. Essas proteínas são capazes de afrouxar as fibras sem rompê-las, facilitando o acesso de enzimas à celulose.

Para a pesquisadora Léia Fávaro, da Embrapa Agroenergia, há um potencial biotecnológico muito grande a ser explorado com as expansinas e monoxigenases. Enzimas são peças-chave no contexto da Bioeconomia para países que pretendem se tornar menos dependentes do petróleo. Este foi o entendimento de 195 países durante a Conferência das Partes (COP-21), que aconteceu em dezembro de 2015. Produzidas principalmente por microrganismos, elas agem sobre a biomassa (partes de plantas ou resíduos de sua exploração, como o bagaço de cana, por exemplo), promovendo as transformações necessárias para que delas sejam obtidas moléculas de origem renovável para a indústria química, entre outros.

Nessa lógica, um produto em evidência é o etanol de segunda geração (2G), cuja produção está começando em duas usinas no Brasil. Diferente do etanol convencional, o 2G não é obtido do caldo, mas do bagaço e da palha da cana ou de qualquer outro material vegetal que contenha celulose. Só que esses materiais não podem ir diretamente para a fermentação como o caldo de cana, rico em sacarose. Antes é preciso fazer um pré-tratamento para liberar a celulose dos outros componentes da biomassa e, então, promover um processo de hidrólise para gerar açúcar – neste caso, a glicose – que pode ser fermentada a etanol. É durante a hidrólise que a enzima atua, ou melhor, dezenas delas, em verdadeiros coquetéis enzimáticos, para realizar sucessivas quebras nas longas cadeias de moléculas de celulose até transformá-las em simples açúcares.

Aumentar a eficiência e reduzir o custo desses coquetéis é um dos grandes desafios para alavancar a indústria do etanol e outros combustíveis de segunda geração (2G), além da obtenção de diversos produtos químicos e biomateriais a partir dos mesmos processos. Até o momento, o desenvolvimento tecnológico para compor esses insumos esteve muito focado nas celulases. A pesquisa em andamento na Embrapa vai fazer diferente e realizar testes para medir a quantidade de açúcar gerado aumentando ou reduzindo a quantidade de expansinas e monoxigenases de polissacarídeos nos coquetéis.

Léia, da Embrapa Agroenergia, explica que esses produtos já contêm enzimas acessórias ou auxiliares, tais como as expansinas e monoxigenases de polissacarídeos. Afinal, são produzidos por microrganismos que naturalmente geram essas proteínas junto com as celulases. Só que muito pouco se sabe sobre o papel delas na desconstrução da biomassa no ambiente industrial. Para começar, pouco se sabe sobre quem são elas. Por isso, o primeiro e mais significativo trabalho do grupo de cientistas liderado pela Embrapa será a formação de um banco de dados com a caraterização bioquímica de novas expansinas e monoxigenases. Para tanto, estão sendo realizadas buscas em duas fontes principais: bancos de dados públicos que disponibilizam as sequências genômicas completas de microrganismos e as coleções de fungos e bactérias da Embrapa Agroenergia, que contêm estirpes da biodiversidade brasileira. “Há espécies raras e pouco estudadas de diferentes biomas. Boa parte delas consome celulose e, por isso, sabemos que há grande potencial”, explica Léia.

Já foi feita a maior parte do trabalho de buscas, que contou com a colaboração da Universidade de Brasília. Agora, o grupo está focado na caracterização bioquímica das enzimas e seleção de candidatos para a etapa posterior, quando investirá na otimização do processo de produção delas em biorreatores. O maior desafio deve ser a quantificação das enzimas produzidas, prevê a pesquisadora Sílvia Belém, da Embrapa Agroenergia.

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