Uma reinvenção do jeito de plantar cana
27-06-2014

Diante das mudanças trazidas pela mecanização, muitos produtores não se adaptaram e pagaram caro por isso. Mas há exceções, como a família Campanelli, que deve terminar essa safra com mais de 100 toneladas de cana/hectare de produtividade

Foto Na Campanelli o processo é todo mecanizado

Clivonei Roberto
Fazer diferente e com profissionalismo. Essa é a filosofia da Agro-pastoril Paschoal Campanelli ao lidar com a terra. É uma empresa agrícola localizada na região de Bebedouro, SP, que se tornou referência ao buscar excelência nas diferentes áreas do negócio.
A empresa está prestes a comemorar mais um ano de boa produtividade. A safra 2013/14 de cana-de-açúcar termina com cerca de 102 t/ha, atingindo os tão sonhados três dígitos para a maioria dos produtores e usinas do País. A produtividade obtida na safra anterior foi de 96,8 t/ha.
A qualidade do trabalho desenvolvido pela Paschoal Campanelli chegou a ser homenageada pelo Grupo IDEA, no início de 2013, quando recebeu o prêmio de fornecedores campeões de produtividade (referente à safra 2012/13).
A Agro-pastoril foi fundada por Paschoal Campanelli, avô de Victor Campanelli – um administrador de empresas que não cansa de buscar uma alquimia de novos conhecimentos, como em agronomia, novas tecnologias ou de mercado, para gerenciar o negócio. E com profissionalismo, embora faça questão de lembrar que é uma empresa familiar.
Segundo Victor, a Paschoal Campanelli produz cana, milho e gado para corte, com cerca de 8 mil hectares com cana, 2 mil ha com milho e 40 mil cabeças de boi. Especificamente no negócio cana, está desde 2001. De lá pra cá, ele reconhece que a agroindústria canavieira passou por muitas mudanças. Mas pelo jeito, apesar dos solavancos e crises, gostou da complexidade da cultura da cana-de-açúcar. Já faz parte da lista daqueles que tomam a cana como um sacerdócio.
Ao falar sobre as transformações que o setor passou, ele destaca o impacto do Protocolo Agroambiental, que definiu 2014 como prazo limite para o fim do uso do fogo para a colheita da cana nas áreas mecanizáveis. “Tivemos que implantar a mecanização da colheita e depois do plantio de forma rápida”, diz.
Sem contar o que veio imposto (com pouco ou nenhum diálogo com o setor), como leis trabalhistas que desconsideram as especificidades do setor, a lei da balança, impostos altos, além da escassez de mão de obra qualificada.
ADAPTAÇÃO ÀS MÁQUINAS – A implantação da colheita e do plantio não está sendo um processo simples para o setor. Victor tem consciência disso. Até porque mecanizar o sistema de produção não é apenas colocar uma máquina para fazer as operações antes desempenhadas manualmente. Diz respeito a modificar todo um sistema produtivo. “Teve muita empresa que ainda não conseguiu fazer isso da maneira mais adequada. Talvez seja correto dizer que o grosso dos produtores não conseguiu entender que o sistema mudou completamente. Que não fazemos mais o que fazíamos vinte anos atrás.”
E essa mudança trouxe queda da produtividade. “Temos que nos adaptar às mudanças, embora muitos ainda continuem fazendo a mesma coisa. Nesse processo de mecanização às pressas, a fórceps, muitos tropeçaram no caminho e não conseguiram se adaptar.”
Na Paschoal Campanelli, apesar do cronograma para o fim da queima, “não mecanizamos sem pensar no melhor jeito de fazer isso”, frisa Victor.
ALGUNS SEGREDOS – Para superar as dificuldades impostas pelas transformações trazidas pela mecanização, a empresa sempre procurou fazer diferente da maioria dos produtores nas mais diversas áreas. Afinal, na visão da equipe que gerencia a empresa, para aumentar o sucesso do negócio, o caminho é inovar, adotar tecnologias, buscar novos conhecimentos e não ter medo de fazer mudança nunca. Resultado: “Todo um pacote de tecnologias que implantamos na produção resultou numa melhor produtividade que obtemos ao final de cada safra”, sublinha Victor.
Mas o que faz parte desse pacote? Investir pesado em tecnologia, buscar equipamentos de qualidade, adotar sistemas que otimizam o resultado, como taxa variável e piloto automático, trabalhar com equipamentos próprios para a colheita, evitando adaptações.
“Na verdade, é um pacote grande. Por conta da mecanização, mudamos a adubação, os tratos culturais. É uma reinvenção do jeito de plantar cana. Todos tiveram que passar por esse processo, mas teve gente que não entendeu o que deveria mudar no sistema.”
Segundo Victor, a empresa não adota variedades diferentes das que a maioria já trabalha. “O ganho não é varietal, mas de manejo. Por exemplo, não usamos mais as fórmulas de adubo com Nitrogênio, Fósforo, Potássio. Trabalhamos de forma diferente do convencional. Temos que investir em tecnologia para melhorar, fazer a tecnologia ser aliada do dia a dia no campo.”
Na fertilização, a empresa trabalha com esterco, tem feito um adubo organo-mineral. “Trabalhar com menor custo de adubação é nossa busca contínua. Por isso, temos tentado reinventar um pouco o manejo para atingir alta produtividade.”
Hoje o nível de mecanização dos canaviais da empresa é de 100% na colheita e no plantio. “Planejamos e executamos, o que é diferente de muita gente que só executa e não planeja”, diz Victor. A Paschoal Campanelli fornece cana para o Grupo Guarani.
PRODUTIVIDADE - Victor torce para que cheguem aos produtores variedades muito mais produtivas, a cana transgênica, manejos mais inovadores do que os que já são empregados e conhecidos. Para o produtor, a chegada de novas ferramentas que permitam alavancar a produtividade é fundamental para a sustentabilidade do negócio.
“Não falaria que hoje cana é um excelente negócio. O grande segredo de conseguir rentabilidade (mesmo numa conjuntura tão problemática) é a gente ter uma boa produtividade”, diz Victor. Segundo ele, a colheita hoje responde a 30% do custo de uma tonelada de cana, praticamente. “Se estiver colhendo uma cana de 60 toneladas por hectare tem um custo, mas se tiver colhendo uma cana de 100 toneladas seu custo cai vertiginosamente. Com produtividade, a gente rentabiliza a nossa terra.”
Nos cálculos, Victor lembra que, ao aplicar o herbicida, se a produção está num patamar de 60 t/ha, o produto vai custar, por exemplo, R$ 1,20 ou R$ 1,30, mas se tiver produzindo 100 toneladas, o herbicida vai sair por R$ 1 a tonelada. “A produtividade é a chave de sucesso para se ter um custo por tonelada melhor do que os outros e conseguir sobreviver.” A busca é pelo baixo custo por unidade produzida.
Mas manter sempre a produtividade num bom nível não é fácil. A política da equipe da Agro-Pastoril é sempre investir para quebrar paradigmas e buscar desafios. Certamente, para a próxima safra, a meta será ultrapassar as 102 toneladas/hectare.
“Nunca temos preguiça de investir, não gostamos de gastar. Investimento para a gente é palavra que não temos medo. Não temos medo de mudança, e não temos medo de investir num negócio que acreditamos.”