A Usina Laginha renasceu das águas, mas sucumbiu às dívidas
01-07-2021

Em 18 de junho de 2010, enchente no rio Mundaú destruiu a usina Laginha, arrasou 59 municípios, desabrigou 70 mil pessoas e causou 40 mortes
Em 18 de junho de 2010, enchente no rio Mundaú destruiu a usina Laginha, arrasou 59 municípios, desabrigou 70 mil pessoas e causou 40 mortes

João Lyra completa 90 anos e representa uma das maiores histórias do setor sucroenergético, marcada pelo apogeu, superação, queda e dívida superior a 3 bilhões de reais

Luciana Paiva

Nesta semana, o Grupo João Lyra voltou a ser manchete nos veículos de comunicação que destacaram que - A Laginha Agroindustrial S/A move um dos maiores processos de falência da história: são 19 mil credores à espera de R$ 1,2 bilhão. Ao todo, o grupo deve mais de RS$ 3 bilhões. A falência do Grupo foi decretada em 2012, e seus credores ainda não receberam, por falta de definição judicial. O Grupo contava com três usinas em Alagoas e duas em Minas Gerais, essas duas já foram a leilão.

A Laginha sob as águas

Em 2010, o grupo João Lyra também ganhou o noticiário, imagens impressionantes mostravam tanques de álcool pesando mais de 180 toneladas

descendo pelo rio Mundaú na enchente que assolou a Usina Laginha, em União dos Palmares, Alagoas, em 18 de junho de 2010. Foram atingidas 59 cidades, deixando 70 mil pessoas desalojadas e 40 mortes.

Em 2011, Chico Celestino, o rio Mundaú e ao fundo a Usina Laginha reconstruída

Dias após a enchente, apareceu Francisco Celestino, na época assessor da diretoria do Grupo João Lyra, em reportagem no programa de televisão Globo Rural, mostrando a situação da Laginha depois que as águas baixaram. O rio Mundaú subiu 15 metros e chegou a atingir três metros de altura dentro das paredes da usina, arrancou o calçamento e provocou buracos de até quatro metros de profundidade. Cinco tanques de etanol, com capacidade para cinco mil metros cúbicos, desceram pela correnteza, máquinas e equipamentos foram, em sua maioria, destruídos. Os barracões, armazéns, laboratórios e escritórios tudo arruinado. Descrevendo a tragédia, Chico Celestino chorou de tristeza enquanto era entrevistado.

Um dos cinco tanques de álcool da Laginha sendo levado pelo rio Mundaú

Na primeira década dos anos 2000, eu visitei as três unidades do Grupo em Alagoas (Uruba, Laginha e Guaxuma). Eram tempos áureos, quando a Guaxuma era conhecida com a unidade mais moderna do Nordeste e quando se tornou a primeira unidade sucroenergética do mundo a conquistar a ISO 14000 – na área ambiental.

A colônia e a linha férrea destruídas depois da enchente

Também estive na Laginha em janeiro de 2011. Não fui lá para conferir a destruição, mas sim, a superação, pois em 12 de dezembro do mesmo ano que foi destruída pela cheia, a Laginha voltou a moer. Novamente Chico Celestino dava uma entrevista para falar sobre a Laginha, no entanto, dessa vez, mostrou a usina reconstruída, relembrou a força das águas e os estragos causados, mas, principalmente, destacou a união e o trabalho árduo da equipe de profissionais do Grupo João Lyra que em tempo recorde colocou a usina pronta para moer.

Marcos Antonio registrou a catástrofe e a reconstrução

Chico Celestino me conduziu por toda a unidade, mostrou os detalhes da reconstrução. Por onde íamos encontrávamos funcionários querendo contar o drama vivido. Um deles foi Marcos Antonio dos Santos, profissional da área ambiental, que atuava há oito anos na Laginha.

“A invasão das águas em União do Palmares fez com que a noite de 18 para 19 de junho fosse um horror. Eu já sabia que a usina tinha sido atingida e logo pela manhã corri para ver o que havia acontecido. Estava uma tristeza, chorei demais. A desolação era geral. Mas vi quando o helicóptero com o Dr. João Lyra sobrevoou a Laginha. O padrão veio ver o estrago. Quando desceu, o pessoal foi todo para perto dele. Havia muita gente com receio do futuro, que a Laginha deixasse de moer. Mas o Dr. João falou: ‘A Laginha não vai parar de moer’. Aí o povo ficou confiante”, contou Marcos que acompanhou a subida das águas, fotografou a catástrofe e a reconstrução da Laginha.

Equipe de reconstrução fez com que a Laginha voltasse a moer em tempo recorde

Na época houve quem questionasse se a decisão de recuperar a Laginha era economicamente viável, afinal, o Grupo João Lyra estava em recuperação judicial e, vendo pelo lado financeiro, talvez a melhor saída seria transferir a cana para as outras duas unidades do grupo, ainda mais depois da catástrofe. No entanto, a Laginha foi a primeira unidade do Grupo, além disso, a economia de União dos Palmares é estritamente ligada à produção da usina. Foram essas as motivações que levaram João Lyra e a equipe de profissionais da empresa reerguerem, em tempo recorde, uma usina que se encontrava assolada. O investimento na recuperação custou mais de 30 milhões de reais, sendo inteiramente bancado com recursos próprios, ou seja, sem qualquer apoio de bancos públicos ou privados.

A Laginha reconstruída voltou a moer ainda em 2010

Assim, em 12 de dezembro de 2010 aconteceu o que muitos não acreditavam, a Laginha voltou a moer, a manutenção de milhares de empregos estava garantida. A moagem na Laginha, era de 700 mil toneladas, naquele ciclo foi de 600 mil, em decorrência do menor período de safra, 100 mil toneladas seguiram para outra unidade do Grupo.

 João Lyra, um dos últimos ícones do setor sucroenergéticos

A Laginha se recuperou da enchente, mas não das dívidas, em 2012 deixou de moer.  Foi decretada a Falência do Grupo. E, hoje, aos 90 anos, completados no último dia 17, o Dr, João, que chegou a empregar mais de 17 mil pessoas somente em Alagoas, se depara com suas usinas com fogo morto e a Laginha Industrial S.A com uma dívida superior aos 3 bilhões de reais.

Fonte: CanaOnline