Brasil tem potencial de atrair US$ 3 tri e se tornar hub de soluções climáticas, diz estudo do BCG
20-09-2024

Adaptação e resiliência, produção de biocombustíveis, minerais críticos e data center são frentes que podem mobilizar significativamente a economia brasileira na descarbonização.

Por Daniela Chiaretti

Os dados são do relatório “Seizing Brazil`s Climate Potential” lançado nesta quarta-feira (18), durante o Brazil Climate Summit 2024, evento que acontece em Nova York e reúne alunos e ex-alunos da Columbia University, pesquisadores, investidores, ambientalistas e empreendedores.

O estudo, do Boston Consulting Group (BCG) reafirma o dado de US$ 3 trilhões de um relatório lançado em 2022. A edição de agora tem mais profundidade e detalhes.

 “O Brasil tem vantagens competitivas para liderar a transição climática, com destaque para soluções baseadas na natureza, biocombustíveis, energia renovável, agricultura sustentável e produtos industriais de baixa emissão”, diz Arthur Ramos, diretor executivo e sócio do BCG no evento.

“Mas, apesar de deter a maior área florestal do mundo, o país ainda enfrenta desafios como o desmatamento ilegal, especialmente na Amazônia”, seguiu.

O Brasil, lembra o texto, é o quinto maior emissor de gases de efeito estufa do mundo com 75% causados pela agricultura, florestas e uso do solo.

O estudo mostra que o Brasil pode se tornar uma potência de biocombustíveis, fortalecendo a produção de etanol e biodiesel que pode ser expandida para combustível de aviação sustentável (SAF) e óleo vegetal hidrotratado (HVO). “O potencial de geração de energia do Brasil com biocombustíveis daria para atender todo o segmento de transportes –carros, ônibus e caminhões”, disse Ramos ao Valor.

Hoje a fatia dos biocombustíveis é de 20%, o que reduz o peso do setor de transportes em cerca de um quarto da emissão. O setor de transportes atualmente contribui com cerca de 200 milhões de toneladas de CO2/ano e a redução permitida pelo uso de biocombustíveis é de 50 milhões de toneladas de CO2/ano.

“É uma contribuição relevante. Se os países do mundo inteiro trilhassem o mesmo caminho estaríamos reduzindo 3% da emissão global que é praticamente a emissão total de gases estufa do Brasil. Seria um Brasil a menos de emissões, cerca de 2 gigatoneladas de CO2”, calcula Ramos.

“Biocombustíveis é um assunto que tem que ser mais trabalhado globalmente”, registra. “É um tema subavaliado e, de certa forma, incompreendido na agenda pelo seu grande potencial de redução de emissões no curto prazo”, diz Ramos.

No Brasil, se suprissem a matriz de transportes com biocombustíveis em 100%, seria possível ter uma redução de mais da metade das emissões atuais do setor. A oportunidade de investimentos seria de US$ 200 bilhões até 2050. “É uma jornada longa”, diz Ramos.

Outro ponto do quebra-cabeças é como produzir biocombustíveis de maneira sustentável. Cerca de metade da produção adicional deveria vir da recuperação de terras degradadas. Seriam 25 milhões de hectares de produção agrícola que gerariam biomassa, e parte dela seria usada para produção de biocombustíveis.

Outra parte viria de ganhos de produtividade. Biocombustíveis incluem etanol para veículos leves e biodiesel para veículos pesados. A configuração futura se baseia em etanol de segunda geração, biodiesel HVO e na aviação, o SAF. Incluiria também biometano para uso industrial.

Alguns críticos dos biocombustíveis dizem que há o risco de se usar terra para produzir energia quando existem milhões passando fome no mundo, ou seja, o temor que a produção de biocombustível seja uma ameaça à oferta de alimentos. “É uma crítica desfocada. Hoje, de toda a área cultivada no Brasil, apenas 3% é dedicado a biocombustível. É uma parcela pequena”, diz Ramos.

Ele lembra que a iniciativa incluiria buscar produção com insumos de grande produtividade como a macaúba, por exemplo. Outra fonte seriam os resíduos agrícolas. “O potencial dos biocombustíveis é grande, temos como suprir a oferta sem que se prejudique a produção de alimentos. Somos muito entusiastas em relação a essa iniciativa”, continua o executivo.

Adaptação e resiliência

Dois outros capítulos estratégicos do relatório discorrem sobre as oportunidades de investimentos em adaptação e resiliência, tópicos cruciais em um país em estado de emergência climática. Trata-se de se preparar o país para extremos climáticos que serão cada vez mais frequentes e constantes. “Há um lado que deve partir do setor público, com políticas e regulamentos, e outro de atuação privado. O retorno é bastante elevado. Os retornos dos investimentos podem ser de cinco a dez vezes”, diz. Alarmes de antecipação de situações críticas de seca, deslizamentos e inundações, por exemplo, não têm grande custo e significam enorme impacto em vidas e em infraestrutura.

Para aumentar a resiliência climática, por sua vez, há um mercado potencial de suprimentos, construção civil e infraestrutura em iniciativas diversas relacionados, por exemplo, à água, produção de alimentos e saúde.

Data center

A grande expansão dos Data Center é outro ponto de oportunidade de investimentos no Brasil, aponta o relatório. “Existirá uma grande demanda por processamento de dados e o Brasil poderia oferecer este trabalho com energia limpa e baixas emissões”, diz.

Hoje os principais centros de dados do mundo estão na China e nos Estados Unidos. “Nos EUA o crescimento é imenso. Se pegarmos 10% desse crescimento e o colocarmos no Brasil, estaríamos falando de algo em torno a US$ 70 bilhões até o final da década”, estima.

No setor de agricultura também há oportunidades de atração de investimentos, estimulando práticas regenerativas, a recuperação de pastagens degradadas e a integração lavoura-pecuária e floresta.

“Há muita oportunidade de investimentos no setor, também se usando inteligência de dados e adotando a visão de território, não olhar apenas para a propriedade. Seria uma visão integrada com esforços para recuperar o bioma. Acredito que agricultura será um dos temas mais importantes da COP 30, no Brasil”, aposta Ramos.

Fonte: Valor Econômico