Campo já sente a greve de caminhoneiros; tabela de fretes preocupa
26-02-2015

A greve dos caminhoneiros já atinge o produtor agrícola. Mas a preocupação vai além. Eles temem que, se for de fato criada uma tabela referencial de fretes --que poderia estipular um valor mínimo para o transporte--, como anunciou o governo, o resultado seja mais um custo para o setor agropecuário.

Em Mato Grosso, principal produtor nacional de soja, já há dificuldades no abastecimento de óleo diesel, o que tem levado à paralisação da safra em algumas fazendas.

As máquinas param exatamente no momento ideal para a colheita. Esse atraso poderá representar perdas futuras ainda maiores, uma vez que as previsões de clima não são favoráveis para as próximas semanas.

A avaliação é de Ricardo Tomczyk, produtor e presidente da Aprosoja (Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso).

Os produtores de Luís Eduardo Magalhães, também chamada de LEM --outro polo importante na produção de grãos no oeste da Bahia--, começam agora a colheita.

A paralisação do transporte nas rodovias que levam a LEM obriga, no entanto, os sojicultores a desviar a produção para outras cidades ou a deixar o grão na própria fazenda.

É o caso de Sergio Pitt, que diz, no entanto, haver "um limite para essa estocagem". Pitt afirma que, ao contrário do que ocorreu em greves anteriores, "nesta a sociedade está solidária com os caminhoneiros no oeste da Bahia, inclusive levando frutas aos grevistas".

Essa aceitação da sociedade ocorre devido ao peso conjunto dos custos de combustíveis e de energia. Os aumentos vêm na contramão do momento da economia, diz.

Domingos Martins, que tem uma produção verticalizada de frangos e é presidente do Sindiavipar (Sindicato das Indústrias de Produtos Avícolas do Estado do Paraná), encontra dificuldade na suas cadeia de produção em Arapongas (PR).

Com as câmaras frias cheias, parou o abate de frango devido à impossibilidade de levar o produto ao varejo. O bloqueio dificulta também a chegada de produtos básicos para a indústria de ração. Sem ração, tem dificuldades para alimentar os animais.

Martins diz que a produção agrícola do Paraná é muito diversificada e cada região tem problemas específicos, mas ninguém consegue sair com produtos acabados dos frigoríficos para o mercado.

O Estado, com 300 milhões de frangos, já tem dificuldade para alimentar os animais em várias regiões.

Se não houver uma solução rápida para a greve, o país terá dificuldade para a continuidade das exportações de frango.

O Brasil é um dos líderes no fornecimento mundial de carne da ave, e 30% do produto sai do Paraná, de acordo com Martins.


Rasgar contratos

Tomczyk diz que a greve dos caminhoneiros deverá afetar os contratos de exportação. Sem o produto brasileiro, os importadores "rasgam os contratos" e vão buscar soja com os norte-americanos, que terminaram a safra há pouco tempo e têm estoque disponível.

Outra preocupação do presidente da Aprosoja é que houve uma total paralisação na comercialização do produto. "Sem possibilidade de escoamento, as negociações travaram", diz ele.

Tomczyk alerta para o fato de que até mesmo as regiões que não têm dificuldade para a compra de combustível vão ter de interromper a safra de soja em Mato Grosso devido à limitação da armazenagem.

É uma situação que tem de ser resolvida logo, caso contrário "isso vai virar um barril de pólvora", diz ele.

A soja, que havia registrado o maior valor em seis semanas na Bolsa de Chicago nas negociações de terça-feira (25), teve queda de 0,8% no contrato de maio nesta quarta-feira (26), recuando para US$ 10,10 por bushel (27,2 quilos).


Milho

A paralisação do transporte nas estradas prejudica também o plantio de milho, que é feito logo após o término da colheita de soja.

Muitos produtores, que foram forçados a um atraso no plantio da soja em 2014 --devido à seca--, podem ter de adiar ainda mais o plantio de milho, devido às dificuldades no transporte de insumos, entre eles os fertilizantes.

*Texto publicado na coluna Vaivém das Commodities.

Mauro Zafalon