Etanol e açúcar colocam Brasil na liderança global da bioeconomia
07-08-2025

Professor Marcos Fava Neves destaca protagonismo do país no agro sustentável e alerta para riscos geopolíticos que ameaçam as exportações

Por Andréia Vital

O Brasil caminha a passos largos para consolidar-se como protagonista da bioeconomia global. A afirmação foi reforçada pelo Prof. Dr. Marcos Fava Neves, durante a palestra “Perspectivas do Agro Sustentável”, no evento Rota Inovadora – Bioeconomia e Agro, promovido pela ANPEI (Associação Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento das Empresas Inovadoras), nos dias 4 e 5 de agosto, em Ribeirão Preto - SP.

Voltado à conexão entre o setor agroindustrial e os polos de inovação e pesquisa, o evento contou com visitas técnicas ao Instituto de Zootecnia, APTA, laboratórios, fábricas e propriedades-modelo. Os painéis abordaram temas como manejo biológico, créditos de carbono, educação executiva e open innovation, consolidando Ribeirão Preto como um dos principais polos de inovação agroindustrial do país.

Fava Neves destacou o novo momento vivido pelo setor sucroenergético, que volta ao centro das discussões com a valorização da bioenergia. Ele citou como exemplo os testes realizados com motores movidos a etanol, biogás e biometano no interior de São Paulo, especialmente na Usina São Martinho, uma das empresas anfitriãs da Rota Inovadora, onde caminhões, tratores e geradores já operam com energia limpa.

“Estamos deixando de depender de diesel importado para mover nossas máquinas com o que produzimos aqui. Isso representa empoderamento energético das empresas”, afirmou.

Para ele, o etanol brasileiro vai muito além de um biocombustível: é uma ferramenta de soberania energética, desenvolvimento regional e diplomacia comercial. A entrada de novos mercados, como a aviação civil, que passará a utilizar bioquerosene a partir de 2027, abre um novo capítulo para o agro nacional.

O palestrante falou ainda sobre a “explosão de investimentos” no etanol de milho. Em apenas 10 anos, o Brasil passou de zero para 24 usinas em operação, com outras 16 autorizadas e 16 em implantação. Cidades como Sinop - MT e Luís Eduardo Magalhães - BA recebem aportes bilionários, transformando a bioenergia em motor de desenvolvimento regional.

Além disso, ele destacou a importância do DDG (grão seco de destilaria) como subproduto nobre para a ração de aves e suínos e a geração de energia limpa com biogás e biometano.

“Uma tonelada de milho gera 400 litros de etanol e até 300 kg de DDG. Isso impulsiona a produção de carnes e ainda retroalimenta o sistema com energia limpa. É a bioeconomia em ação”, frisou.

O sorgo também aparece como alternativa estratégica, especialmente em regiões onde a cana e o milho não são viáveis. “Com sorgo e milho, a Bahia poderá abastecer seus postos com combustível local, competitivo e sustentável”, explicou.

Açúcar brasileiro domina o mercado mundial

Segundo o professor, o Brasil já é o maior exportador mundial de açúcar, responsável por 52% de todo o volume globalmente comercializado.

“Somos donos da metade do açúcar consumido no planeta. E boa parte disso é produzida com responsabilidade ambiental, rastreabilidade e uso eficiente da terra”, destacou.

O diferencial brasileiro, segundo Fava, está no uso de tecnologia de ponta, com colheitas mecanizadas, irrigação por gotejamento, uso de bioinsumos e monitoramento climático em tempo real.

Apesar das boas perspectivas, Fava Neves alertou que nem todas as empresas do agro irão prosperar. Os maiores entraves são problemas de gestão, endividamento e falta de mão de obra qualificada. Ele ressaltou que há enorme potencial de expansão de área produtiva sem desmatamento.

“O Brasil possui 851 milhões de hectares de área total. Usamos 241,5 milhões para o agro. Podemos ampliar em pelo menos 20 milhões de hectares apenas com uso mais eficiente de pastagens e com aumento do número de safras”, explicou.

Para isso, defendeu investimentos em ciência e pesquisa, como base para manter a competitividade do país no cenário internacional.

Tensão geopolítica: “O Brasil é um chihuahua enfrentando um pitbull”

Em tom de alerta, Fava criticou a atual postura diplomática do Brasil diante de grandes potências, especialmente os Estados Unidos. Ele comparou o país a “um chihuahua enfrentando um pitbull”, deixando claro que declarações impensadas e postura agressiva podem comprometer mercados essenciais para o agroexportador.

“Precisamos voar abaixo do radar. O agronegócio é responsável por mais da metade do superávit da balança comercial. Comida é paz, comida é democracia. O mundo depende de nós mais do que nunca”, afirmou.

Ele enfatizou que produtos como mamão, manga e tilápia, por serem perecíveis, não toleram atrasos logísticos nem rompimentos diplomáticos. “Um impasse político pode resultar em cancelamento imediato de embarques e prejuízos irreversíveis”, alertou.

Turbulências à frente: clima, guerra e falta de pessoal

Fava Neves também listou os principais desafios enfrentados pelo agro nacional como eventos climáticos extremo; riscos de pandemias humanas e zoonoses; guerras e tensões geopolíticas; ataques cibernéticos e crises de fertilizantes; altos juros e aumento dos custos; falta de mão de obra qualificada e retrocesso nas políticas trabalhistas.

“Hoje falta gente em todos os elos do setor”, afirmou. “Não abrimos novos mercados em 30 dias. Precisamos de estabilidade, planejamento e visão estratégica.”

Ao final, Fava Neves reforçou que o Brasil possui recursos, tecnologia e clima favorável, mas precisa de gestão estratégica, diplomacia e investimento em inovação para manter seu protagonismo.

“Enquanto o mundo discute descarbonização, nós já temos soluções reais — e em escala industrial. O açúcar e o etanol são símbolos do nosso modelo de desenvolvimento sustentável. O agro pode — e deve — ser o motor do futuro do Brasil”.

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