Governo espera queda de 5% no consumo do ciclo Otto e setor deve puxar produção de açúcar
04-03-2016

O governo federal revelou a representantes do setor produtivo de etanol e açúcar que trabalha com uma queda de 5% no consumo de combustíveis do ciclo Otto (gasolina, álcool e gás natural) em 2016. São cerca de 2,6 bilhões de litros a menos sobre a demanda de 53 bilhões a 54 bilhões de litros de 2015. Nesse cenário, um emissário do Planalto pediu ontem, em uma reunião em Brasília (DF), ao menos a manutenção da produção e da oferta de etanol ao mercado interno este ano. Com a demanda em queda e uma produção estável de álcool, governo e a combalida estatal Petrobras precisariam importar menos petróleo e gasolina.

Como resposta, ouviu um não. Ouviu ainda que governo pode não mais exigir compromissos depois do que fez com o setor entre abril de 2008 e janeiro de 2015. Nesse período, para evitar as altas da gasolina e da inflação, o poder público reduziu, gradativamente, a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) cobrada sobre o combustível de petróleo, até zerá-la.

Em 2008, a Cide era de R$ 0,28 por litro de gasolina vendida na bomba. A partir daí, o governo reajustou sucessivamente a gasolina nas refinarias e diminuiu a Cide para evitar o repasse aos consumidores. Em abril de 2008, baixou-a para R$ 0,19, em outubro de 2011 para R$ 0,09 por litro e, em junho de 2012, zerou a Cide. Em maio 2015, voltou a taxar a gasolina, em R$ 0,22 centavos por litro, soma de R$ 0,10 da ressuscitada Cide e outros R$ 0,12 de PIS/Cofins.

Mas a retomada da taxação foi em benefício próprio, pois o governo tinha como único objetivo com a medida ampliar a arrecadação em estimados R$ 12 bilhões no ano passado e em R$ 14 bilhões em 2016. Os produtores até foram beneficiados indiretamente, já que o preço do etanol, livre, subiu juntamente com o da gasolina. Mas o dólar também aumentou no ano passado e o preço do açúcar, cotado na moeda norte-americana, se recupera lentamente com a previsão de déficit na demanda global, tornando a commodity brasileira novamente competitiva no exterior.

Além disso, a expectativa do governo é mais pessimista do que a apresentada pela Copersucar. Em janeiro, a empresa projetou que espera uma queda de 3% para o ciclo Otto. No entanto, as informações da ANP revelaram que o consumo em janeiro caiu 11,78%, a maior desde que os dados passaram a ser divulgados.

Na prática, ao projetar uma queda de 5% na demanda de combustíveis este ano e sem qualquer compromisso do setor pela manutenção da mesma oferta de 2015, o governo verá essa redução no consumo de gasolina e de etanol virar açúcar. Todas as estimativas de produção feitas até agora apontam para uma alta na produção da commodity na safra 2016/2017 de cana-de-açúcar e uma queda na produção do álcool.

Exemplo desse "empenho" do setor sucroenergético foi dado ontem. No mesmo horário que o emissário do governo cobrava executivos em Brasília, no interior de São Paulo o empresário Bernardo Biagi, presidente do Grupo Batatais, previa ampliar em 30% o açúcar e reduzir em 4% o etanol fabricado em relação ao ano passado nas suas duas usinas. No encontro com jornalistas, Biagi externou qual é o compromisso com o governo. "Com lucro, ou prejuízo dos últimos dos anos, nós pagamos R$ 100 milhões de impostos por ano. Esse é o nosso compromisso e não tem como fugir".