Mesmo com plano de recuperação judicial considerado viável, bancos forçam venda das unidades do Grupo Moreno
09-09-2020

Coplasa, a maior unidade do Grupo Moreno, localizada em Planalto, é a mais cobiçada
Coplasa, a maior unidade do Grupo Moreno, localizada em Planalto, é a mais cobiçada

Produtores de cana, prefeitos e população de cidades anexas as unidades do Grupo, temem pela venda das usinas, pois há risco de deixarem de moer, o que provocaria um caos social

Luciana Paiva

Em 18 de setembro de 2019, o Grupo Moreno – que é composto pelas empresas Central Energética Moreno Açúcar e Álcool (CEM), localizada em Luiz Antonio, Central Energética Moreno de Monte Aprazível Açúcar e Álcool (CEMMA), Coplasa - Açúcar e Álcool Ltda, instalada em Planalto, SP, Agrícola Moreno de Luiz Antônio (AMLA), Agrícola Moreno de Nipõa Ltda. (AMN) e Planalto Bioenergia Spe – pediu recuperação judicial.

Criado há 61 anos, quando os irmãos Moreno montaram, em Sertãozinho, SP, a Metalúrgica Moreno Ltda, uma empresa para fabricação de equipamentos para Usinas de Açúcar, o Grupo Moreno instalou sua primeira destilaria de álcool em 1982, no município de Luiz Antonio, SP. Em 1994, a unidade passou a produzir também açúcar.

Seguindo o ritmo da expansão sucroenergética, ocorrida na primeira década dos anos 2000, o Grupo Moreno construiu a unidade em Monte Aprazível, e em 2006 adquiriu o projeto de instalação da Coplasa Açúcar e Álcool Ltda, localizada em Planalto, que entrou em funcionamento em 2007.

CEM, unidade instalada em Luiz Antonio, a primeira do Grupo

No entanto, como grande parte do setor, o Grupo Moreno sentiu forte o golpe da crise econômica mundial de 2008 e mais ainda a crise do setor, provocada pela política governamental que privilegiava à gasolina. Alavancado pelos investimentos e com baixa remuneração em decorrência do mercado pouco atraente para o etanol, o Grupo viu sua situação financeira se deteriorar e as dívidas aumentarem – em 2019, quando pediu a recuperação judicial a dívida girava em torno de R$ 2 bilhões.

ASSEMBLEIAS DOS CREDORES DO GRUPO MORENO 

Na última sexta-feira, 4, aconteceu, por meio online, uma assembleia geral dos credores do Grupo Moreno, em continuação à primeira realizada em 14 de agosto de 2020, para apreciação do plano de recuperação judicial do Grupo. Segundo Donaldo Paiola, produtor rural e representante dos fornecedores e arrendatários da Moreno, cerca de 750 produtores de cana, apesar de o plano ser muito bem estruturado e seu cumprimento ser viável, os bancos, estão forçando para que seja incluído no plano a venda das unidades da Moreno.

Paiola explica, que no plano de recuperação inicial apresentado pelo Grupo já havia uma previsão de vendas de ativos, que se iniciava com a venda do projeto de cogeração, depois a capitalização com a venda de outros ativos, que poderia até ser uma unidade, no caso a CEM, mas isso, só no caso de o Grupo não estiver honrando a previsão do plano. 

CEMA, unidade do Grupo em Monte Aprazível, que corre o risco de ser fechada no caso de venda

Porém, os bancos não aceitaram a proposta. “O Santander, um dos principais credores do Grupo Moreno, apresentou um plano alternativo, propondo a venda das unidades CEMA e COPLASA para a Cofco International, dona de uma unidade sucroenergética há 30 quilômetros de distância duas unidades da Moreno”, conta Paiola.

Em resposta, o Grupo Moreno colocou em seu plano de recuperação a venda da Central Energética Moreno (CEM), de Luiz Antonio, que na primeira versão do plano aparecia como condição de venda, caso o Grupo não cumprisse seus compromissos. Mas a proposta não saciou o apetite dos bancos, que querem mais, o principal objeto de desejo é a Coplasa, a maior das três unidades, com capacidade de moagem para 6 milhões de toneladas de cana- de-açúcar por safra.

Entre os bancos, quem mais pressiona para que as unidades sejam vendidas é o Santander, que ameaça até mesmo pedir a falência do Grupo Moreno. No entanto, informou uma fonte, o Santander além de ser credor, também atua como “corretor” na venda para a Cofco, o banco tem mandato de compra da usina. O que, para muitos, significa conflito de interesse e, nesse caso, o Santander não pode votar.

 Procuramos o Santander para saber seu posicionamento em relação à recuperação judicial do Grupo Moreno e a assessoria de imprensa nos informou que o banco Santander não fala sobre a situação de seus clientes.

FORNECEDORES DE CANA SÃO CONTRA A VENDA DAS UNIDADES DO GRUPO MORENO

O Grupo Moreno não pode se posicionar sobre o caso, mas outros credores, como produtores de cana que fornecem para as unidades da empresa, estão se posicionando e são contrários à venda das unidades. Juliano Goulart Maset, presidente da Associação dos Plantadores de Cana e Outras Culturas da Região de Monte Aprazível (Aplacana), salienta que o plano de recuperação judicial apresentado pela Moreno é um dos melhores já vistos no setor, tanto que o Grupo nem pediu deságio – para se recuperarem as empresas podem legalmente obter deságios de seus débitos vencidos e vincendos para com os credores.

Cerca de 85% dos associados da Aplacana fornecem para as unidades do Grupo Moreno

A Aplacana conta com 500 associados, dos quais 85% fornecem para as unidades da Moreno de Monte Aprazível e de Planalto. A dívida da Moreno com os associados da Aplacana chega a 90 milhões de reais, referente a reajustes de safra. De acordo com Maset este montante é o mesmo que o Grupo deve ao Santander.

“Não é uma dívida impagável e a Moreno é uma empresa com estrutura, tem realizado seus pagamentos, está cuidando dos canaviais, ou seja, tem feito sua parte para que a recuperação dê certo. O que eles precisa é de tempo para pagar suas dívidas. E isso os bancos não querem dar, querem receber primeiro e à vista, não se preocupam com os demais credores. Grande parte dessa dívida com o banco é de juros. Já no caso dos produtores é a nossa produção, é o fruto de nosso trabalho”, ressalta.

Paiola concorda com Maset tanto em relação a viabilidade do plano de recuperação judicial do Grupo Moreno e quanto à qualidade dos canaviais de suas usinas. “Ter matéria-prima, ter cana para moer é um dos principais fatores que contribuem para a recuperação de uma usina, e a Moreno tem cuidado muito bem de seus canaviais. Acompanhamos no dia a dia o trabalho que realizam em tratos culturais, tudo muito certo”.

VENDA DAS UNIDADES E POSSÍVEL FECHAMENTO DE UMA DELAS AFETARÁ NEGATIVAMENTE A ECONOMIA DA REGIÃO

Monte Aprazível corre risco de perder sua unidade sucroenergética

 A venda das duas unidades da Moreno para a Cofco deixa os fornecedores apreensivos, pois, além de passar a haver um monopólio pela cana na região, corre a notícia que o grupo chinês iria fechar a CEMA. “Isso irá causar um caos social em Monte Aprazível, já somos conhecidos por polígono da fome, devido à falta de oportunidades. Aqui só tem um laticínio e a usina, que é quem mais gera impostos para o município. Com o fechamento, além da queda da arrecadação, haverá desemprego, não só dos funcionários da empresa, mas das oficinas, borracharias, pois a Moreno realiza 100% desses serviços na cidade. E isso é só o começo, os estragos na economia da cidade serão diretos e indiretos”, observa Maset.

De acordo com Paiola, os fornecedores de cana na região de Monte Aprazível não têm nada contra a Cofco, mas preferem que as unidades se mantenham com a Moreno. “A Cofco paga tudo direitinho, em dia, mas é multinacional, a conversa é mais difícil. Já estamos acostumados com a Moreno, é tudo mais acessível. E sabemos que, se derem oportunidade para eles, vão se recuperar. Os bancos fazem um marketing bonito sobre o seu lado social, mas só pensam neles. Eles têm garantia real de que receberão, depois serão quitadas as dívidas trabalhistas, já os fornecedores de cana, no caso de venda das unidades, nem sabem se receberão.”

Maset também salienta a falta de compromisso social por parte dos bancos. “Não estão nem aí para a população. Estamos muito revoltados, principalmente com o Santander, vamos fazer uma campanha para que os associados da Aplacana encerrem suas contas com o banco e pensamos em usar a força das mídias sociais par tentar sensibilizar a justiça para que não aceite a proposta de vendas das unidades, o que irá balar seriamente a economia da região.”

Poloni também teme pela venda das unidades do Grupo Moreno

A pequena cidade de Ponoli, com menos de seis mil habitantes, fica entre as unidades do Grupo Moreno de Monte Aprazível e Planalto, sem indústria açucareira, Poloni não recebe ICMS gerado pelas usinas, mas de forma indireta é beneficiado pelas unidades da Moreno. E a possível venda das unidades do Grupo tem tirado a tranquilidade de seus moradores.

Antonio José Passos é prefeito de Poloni, mas também é fornecedor de cana da Moreno e tem uma frente de trabalho, com 70 funcionários, que presta serviços às unidades do Grupo. Segundo ele, a economia do município é muito dependente das unidades da Moreno, não só em decorrência dos empregos diretos, mas dos indiretos.

“É a demanda dessas unidades que mantém as oficinas e outras atividades do comércio. Temos um relacionamento muito bom com o Grupo Moreno e a venda das unidades nos preocupa muito. Meu pai foi um dos cinco responsáveis pela vinda da família Moreno para a região. Os incentivou para investir aqui, pois havia um espaço para a cana e nós necessitávamos de emprego e renda”, conta Passos, ressaltando que a importância social precisa ser levada em conta pela justiça.

No dia 23 de setembro, os representantes da Moreno devem apresentar o plano de recuperação com alterações e a nova assembleia dos credores do Grupo Moreno ocorrerá no dia 28 de setembro, será online, aberta, podendo ser acompanhada pelo Youtube.

Fonte: CanaOnline