Odebrecht enxuga portfólio de negócios e define novos líderes
19-01-2017

A poucos dias do fim de 2016, o grupo Odebrecht definiu uma nova estrutura de gestão, mais enxuta e com nova governança, para suas operações, envolvendo o Brasil e exterior. Com a reorganização, no todo, passaram a existir no conglomerado empresarial liderado pela família Odebrecht dez negócios. Em dezembro de 2015, quando Marcelo Odebrecht deixou de vez o comando da holding do grupo, no portfólio haviam 15 negócios.

As mudanças vão desde a unificação de negócios, como em Engenharia e Construção, até a extinção de empresas, criação de uma nova companhia encarregada de gerir o que sobrou das áreas de defesa e construção naval e a nomeação de novos executivos.

No futuro, a depender do programa de venda de ativos em curso, para arrecadar R$ 12 bilhões até meados deste ano, das negociações de dívidas de empresas como a Óleo e Gás (cerca de US$ 5 bilhões) e da viabilidade de outros, como o da área imobiliária, não se descarta novo enxugamento do portfólio. A empresa confirmou as mudanças na gestão, mas preferiu não conceder entrevista.

Novos executivos para os negócios foram recrutados nos escalões intermediários da organização, passando a ocupar cargos de muitos que foram envolvidos nos acordos de delação com o Ministério Público Federal. Ao todo, foram 77 pessoas, incluindo Emílio Odebrecht e seu filho Marcelo.

Tão logo foi assinado o acordo de leniência com procuradores do MPF, com Estados Unidos (Departamento de Justiça) e autoridades da Suíça, em decorrência das investigações da Lava-Jato, a Odebrecht efetivou a nova estrutura de comando, que traz seis novos nomes de líderes, comparado com dezembro de 2015. O que se busca, agora, é uma nova rotina de gestão dos negócios.

O acordo de leniência ainda passa pelo rito de homologação do Supremo Tribunal Federal. Está a cargo do ministro Teori Zavascki e a expectativa é que seu conteúdo seja aprovado, integral ou parcial, no próximo mês. Ele é considerado na Odebrecht o novo "marco zero" da companhia, depois do tsunami da Lava-Jato.

As investigações identificaram pagamentos de propinas em obras da Petrobrás no país e a construtora mais a Braskem vão pagar R$ 6,9 bilhões de indenizações num período de 23 anos.

O grupo ainda tem pela frente as negociações de acordos com autoridades de mais de uma dezena de países, como Peru, Colômbia, Panamá e Equador, onde foram identificados pagamentos irregulares em contratos de diversas obras de infraestrutura.

Conforme apurou o Valor, a maioria das mudanças foram reveladas durante encontro de fim de ano do alto escalão da holding com de cerca de 200 executivos, na sede de Salvador, Bahia.

Na nova grade de negócios, as cinco áreas de Engenharia e Construção (Brasil e exterior) foram concentradas em duas: Infraestrutura e Industrial, ambas com atuação internacional e cada uma com seu respectivo líder.

As demais, já conhecidas, são a petroquímica Braskem, OR (negócio imobiliário), Odebrecht Transport (concessões de infraestrutura no Brasil), Latinvest (réplica da OTP no exterior), Agroindustrial (de etanol e açúcar) e Óleo e Gás (exploração de petróleo). Recentemente foi criada a Empresa de Construção Naval (ECN) para abrigar o Estaleiro Enseada e o projeto de um submarino.

A décima unidade de negócio é a Foz, que herdou ativos de saneamento ambiental no exterior da Odebrecht Ambiental, que foi vendida em novembro para a canadense Brookfield. Os ativos estão no México, Peru e Angola.

A Odebrecht Defesa e Tecnologia (ODT), que não prosperou, e a Odebrecht Properties (gestão de ativos imobiliários) foram extintas. Ativos, como a Mectron, estão à venda. As duas empresas foram criadas no plano de expansão do grupo, acelerado a partir de 2007.

No pacote de mudanças, Luciano Guidolin foi recrutado na Braskem, onde era vice-presidente do principal negócio da petroquímica Braskem, o de resinas plásticas. Com carreira na Odebrecht desde 1994, o engenheiro formado pela USP passou a ocupar o cargo de vice-presidente de Investimentos e Análise de Risco da holding.

Segundo apurou o Valor, o cargo é estratégica. Ele terá a função de dar suporte à holding, avaliando o dia a dia de cada um dos negócios. Tanto que o executivo, após assumir o posto no início de janeiro, já foi nomeado presidente dos conselhos de administração de seis empresas. Não ficaram com ele Braskem, Odebrecht Engenharia e Construção e Óleo e Gás.

Na holding, executivo da Braskem foi recrutado para assumir uma nova vice-presidência, de Investimentos e Análise.

Guidolin, segundo uma fonte, é visto como um potencial líder em ascensão na nova fase do grupo, que teve vários outros na mesma condição ceifados nas investigações da Lava-Jato. O executivo é cotado como candidato interno a ser presidente da holding no futuro, quando Emílio Odebrecht definir qual o desfecho da reestruturação da gestão da companhia. O empresário, que preside o conselho de administração, negociou com o MPF um ano para poder realizar a reorganização.

Em meados do ano passado, na holding, já havia sido criada a vice-presidência de Comunicação e Sustentabilidade, assumida por Marcelo Lyra, também trazido da Braskem. Logo a seguir, Olga Pontes também foi recrutada para ser a diretora-chefe de compliance.

Nilton Sérgio de Souza, homem de confiança de Emílio, está no comando do grupo desde a prisão de Marcelo, em junho de 2015. Foi efetivado no cargo quando se concluiu que Marcelo não tinha mais condições de retornar ao comando no fim daquele ano.

Com as mudanças, a Odebrecht tem como meta adotar nova governança entre o presidente da holding e os executivos das empresas. A relação passa a ser com os conselhos de administração e não mais diretamente, como era com Marcelo Odebrecht.

O foco da companhia, neste momento, é aprimorar a governança, adotar procedimentos de conformidade (compliance) em cada negócio, reestruturação organizacional e a venda de ativos. Em cada empresa foi criado um comitê de compliance, vinculado ao conselho de administração. Já foram contratados diretores e pessoas de apoio que somam 40 profissionais para cuidar disso.

No intuito de mostrar mais transparência, foi definido que os conselhos das empresas terão 20% ou no mínimo dois conselheiros independentes. Esse processo ainda está em curso e só deve ser concluído após a homologação do acordo de leniência.

O sonho de Marcelo Odebrecht de tornar o conglomerado um gigante brasileiro, com R$ 200 bilhões de faturamento na virada de 2020, desmoronou com a Lava-jato. Em 2015, atingiu R$ 132 bilhões e o grupo carregava uma dívida bruta de R$ 110 bilhões. Com a venda de ativos e a perda de contratos na construção e engenharia, a tendência é de recuo ano a ano.

Segundo informações, a Odebrecht já encerrou 2016 com faturamento abaixo de R$ 100 bilhões, afetada principalmente pela perda de receita na área de construção, segundo maior negócio, atrás da petroquímica. A Braskem tem faturamento estimado na casa de R$ 55 bilhões.

A dívida total, por sua vez, também caiu, para a casa de R$ 95 bilhões, porém cerca de 75% já estaria refinanciada com os credores.