USP revela regiões-chave para descarbonização com tecnologias CCS e BECCUS
18-07-2025

Estudo fornece uma análise geográfica detalhada das fontes de emissão de carbono no Brasil

O Centro de Pesquisa para Inovação em Gases de Efeito Estufa (RCGI), sediado na Universidade de São Paulo (USP), entregou ao Ministério de Minas e Energia um levantamento inédito que identifica, com base em metodologia geoespacial inovadora, regiões brasileiras com alto potencial técnico para tecnologias de Captura e Armazenamento de Carbono (CCS) e Bioenergia com Captura, Uso e Armazenamento de Carbono (BECCUS).

O trabalho faz parte do projeto Percepção Social e Diplomacia Científica nas Transições Tecnológicas para uma Sociedade de Baixo Carbono, que integra o programa Advocacy do RCGI.

O relatório foi apresentado em 14 de julho durante o evento Combustível do Futuro: Workshop CCS, CCUS e BECCS, realizado em Brasília - DF. A apresentação contou com a participação da professora Karen Mascarenhas, diretora de Recursos Humanos e Comunicação Institucional do RCGI e coordenadora do projeto, e da pesquisadora Drielli Peyerl, responsável pelo estudo e atualmente vinculada à Universidade de Amsterdã.

O estudo integra informações de emissões industriais, produção de biocombustíveis, infraestrutura logística e geologia marinha, criando um verdadeiro “atlas das oportunidades” para a descarbonização no país. Diferente de abordagens isoladas, essa proposta permite sobrepor aspectos técnicos, econômicos e sociais, fornecendo base para decisões públicas e investigações futuras sobre a aceitação social dessas tecnologias.

Para Karen Mascarenhas, essa abordagem amplia o alcance da ciência. “Mapear as regiões com maior potencial técnico é o primeiro passo para construir políticas públicas eficazes. Mas essas políticas precisam também da confiança e do envolvimento das comunidades locais, que são diretamente impactadas pelas transformações”, destaca.

Locais prioritários aliam viabilidade técnica a vocações produtivas regionais

Segundo Drielli Peyerl, o relatório utilizou a plataforma QGIS para sobrepor dados e identificar áreas onde as tecnologias CCS e BECCUS não só são viáveis, como também complementam a infraestrutura e a dinâmica produtiva local. O estudo aponta exemplos emblemáticos em diversas regiões brasileiras:

Para CCS, destacam-se: Serra - ES: concentração da indústria siderúrgica; São Gonçalo do Amarante - CE: presença de siderúrgicas e termelétricas a carvão e gás natural e Manaus - AM: emissões de termelétricas a gás, em local de sensibilidade ambiental.

Para BECCUS, os destaques são: Uberaba - MG: polo de bioenergia com emissões de CO₂ de alta pureza e municípios de Mato Grosso: produção relevante de etanol, biodiesel e biometano.

Estocagem geológica marinha é destaque entre as capacidades brasileiras

O relatório revela que os maiores potenciais de armazenamento geológico de carbono se encontram em bacias sedimentares marinhas, sobretudo nos litorais do Espírito Santo, Ceará e Rio Grande do Norte, com capacidade estimada entre 167 e 372 megatoneladas (Mt) de CO₂. Esses locais contam com infraestrutura da indústria de petróleo e gás, além de conhecimento geológico consolidado, o que reduz os custos e os riscos de implantação.

Outras regiões, como partes do Sudeste, Nordeste e Amazônia, possuem capacidade intermediária (entre 32 e 167 Mt), e foram consideradas prioritárias também pela proximidade com polos emissores e pela infraestrutura existente, como gasodutos e ferrovias.

As tecnologias CCS e BECCUS estão diretamente ligadas ao cumprimento do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 13 – Ação contra a mudança global do clima, por sua contribuição à redução de gases de efeito estufa. Contudo, o relatório aponta possíveis impactos adversos: ODS 14 (Vida na Água): riscos de vazamento no armazenamento geológico offshore e ODS 6 (Água Potável e Saneamento): elevada demanda hídrica de alguns processos.

Dessa forma, o estudo recomenda avaliações ambientais e técnicas criteriosas, considerando caso a caso a aplicabilidade segura das tecnologias.

O documento reconhece o grande potencial técnico do Brasil, especialmente em setores como siderurgia, cimento, refino de petróleo e bioenergia. Os principais benefícios incluem  a redução significativa das emissões de CO₂; a criação de empregos verdes e o papel estratégico no processo de descarbonização industrial.

Porém, o relatório também destaca desafios estruturais alto custo tecnológico; dificuldades de monitoramento do carbono estocado; falta de incentivos e regulamentações específicas; riscos de rejeição social devido ao desconhecimento ou desconfiança.

Entre as sugestões do relatório para viabilizar os projetos estão:

  • o estabelecimento de normas claras sobre a responsabilidade pelo carbono armazenado;
  • o incentivo a projetos-piloto em áreas com alto potencial técnico;
  • a implementação de sistemas de monitoramento contínuo com protocolos auditáveis e o reforço em estratégias de engajamento e comunicação com a sociedade.

“Nosso estudo representa um primeiro passo sólido para identificar indicadores-chave e polos de captura de carbono no Brasil. A proposta vai além da análise técnica, integrando os pilares do desenvolvimento sustentável”, afirma Drielli Peyerl.

O relatório, intitulado Geospatial Assessment of Carbon Capture and Storage (CCS) & Bioenergy with Carbon Capture and Storage (BECCS) Opportunities in Brazil – Volume 1, foi elaborado pelos pesquisadores Alex Azevedo, Celso Cachola, Mariana Ciotta, Karen Mascarenhas e Drielli Peyerl.

A íntegra do estudo está disponível no site oficial do RCGI. A expectativa é que a metodologia desenvolvida sirva de modelo para aprimoramentos futuros e novas análises estratégicas de descarbonização no Brasil.