Vai sobrar açúcar no Brasil
31-07-2014

Queda de 40% em menos de três anos: essa é a desvalorização do preço do açúcar no mercado internacional desde 2011. Some-se a isso países compradores super estocados e está formado o cenário que as usinas brasileiras vivem na safra atual: queda nas exportações, crescimento da estocagem e aumento do endividamento. Não por acaso, de janeiro a maio deste ano o volume de açúcar exportado pelo Brasil teve uma queda de 14% em relação a igual período do ano passado, para 8,25 milhões de toneladas. Em 2013, as vendas externas foram de 9,6 milhões de toneladas de janeiro a maio.

Segundo o presidente da Datagro, Plinio Nastari, mais do que o preço, foi a queda da demanda externa que derrubou as exportações brasileiras. Ele diz que o escoamento de produção está mais fraco do que estava no ano passado, especialmente por conta de estoques elevados na Ásia, como a Tailândia, cuja safra está adiantada em relação a 2013. A safra da Tailândia está adiantada em relação ao ano passado, o que aumenta a concorrência com o produto nacional. "Além disso, a China tem muito açúcar disponível, daí a queda nas vendas. Outros compradores, entretanto, mantêm os embarques, mas não o suficiente para ampliar ou segurar as exportações no nível de 2013", conta Nastari.

Opinião semelhante tem o analista Mauricio Muruci, da consultoria Safras & Mercado. Ele explica que, além da superestocagem, a previsão é de queda na demanda, pois a recuperação de EUA e União Europeia está demorando mais do que o previsto. "E mesmo a China, embora continue crescendo, vem desacelerando a expansão do PIB, o que significa menor demanda", afirma. Além disso, diz Muruci, o preço do açúcar em Nova York (que dita os preços internacionais) vem desacelerando fortemente nos últimos três anos, passou de US$ 0,28 por libra peso (cerca de 450 gramas) em 2011, para US$ 0,17, em média, este ano.

"No curto prazo, a tendência é que os preços continuem caindo, pois não estamos nem no meio da safra. A projeção é que os preços só melhorem a partir de dezembro, já que, por conta da estiagem do início do ano, pode haver uma antecipação do fim da colheita para novembro. Aí, sim, poderá ocorrer uma recuperação", explica.

Diretor da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica), Antonio Padua Rodrigues diz que outro agravante para as exportações é que as tradings, responsáveis pela compra da produção das usinas de pequeno e médio porte e assim, pelas exportações, estão preferindo comprar de regiões mais próximas do mercado consumidor, especialmente da Ásia, por questões de logística.

Por conta disso, a Unica estima que neste ano o Brasil deixe de exportar 10% do que exportou no ano passado, o que representa menos 2 milhões de toneladas. "Isso se deve à queda nas exportações e também à quebra da safra por conta da estiagem na região Centro-Sul, principal produtora de cana."

Ainda assim, a Conab calcula que a produção de açúcar deverá ter um aumento de 4,17% na safra 2014/2015, para 39,4 milhões de toneladas. A ampliação se deve especialmente pelo aumento da área plantada em 3,6%, já que a seca diminuiu a produtividade da cana de 74,7 quilos por hectare, na safra 2012/2013, para 73,769 k/h na atual.

A explicação para esse aumento de área plantada, apesar dos preços em queda, é que a remuneração do açúcar ainda é melhor do que a do etanol. Segundo Muruci, da Safras & Negócios, em junho a remuneração do açúcar estava 17% acima da remuneração do etanol. "Apesar de todo o cenário de queda de preço internacional, o produtor ainda ganha mais produzindo açúcar do que etanol. Mas o problema está no preço do etanol, já que o produtor não pode repassar o aumento de custos ao consumidor, sob o risco de perder ainda mais competitividade em relação à gasolina". Ele lembra que, para ser competitivo, o etanol deve custar até 70% do preço da gasolina.

Assim, a tendência é que o endividamento das usinas aumente ainda mais. Estimativas apontam que as empresas iniciaram a safra atual com R$ 65 bilhões de dívidas. Sem fôlego para ampliar investimentos, a projeção é sombria para as pequenas e médias empresas nacionais, que representam 15% das usinas em operação. No médio prazo, elas podem interromper as operações, a exemplo das 58 usinas da região Centro-Sul que fecharam as portas desde 2007 até agora, segundo a Unica.